Artigo: A CONFIANÇA USURPADA

 

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Ex-mecânico, fez inúmeros amigos. Era admirado pelo modo afável de ser e o tratamento cortês dispensado. Através de suas inclinações comerciais, tornou-se empresário do ramo de autopeças, conquistando uma grande freguesia, tornando-se referência no setor de peças e serviços.

 

A empresa cresceu e foi necessário contratar empregados. O empresário optou por dar serviço aos familiares. Não tinha experiência em vendas, porém os familiares assumiram essa função e desempenhavam-na de forma confiável, o que dava tranquilidade ao contratante.

 

Soube, entretanto, que, em uma cidade vizinha, uma firma de autopeças estava encerrando as atividades e possuía um empregado que se destacava pela experiência, campeão de vendas na empresa, um expert no comércio de vendas de peças e acessório para automóveis.

 

Os interessados discutiram os prós e os contras e chegaram a um denominador comum. Trataram de salários, da sua vinda para a localidade proposta, aposentos e a promessa de que, passado o período de experiência, dar-lhe-ia o status de chefe do setor. A proposta foi aceita.

 

O recém-contratado angariou não só o entusiasmo como também a confiança do novo-rico empregador. Este, pelas informações obtidas, cria piamente na competência daquele. O novo empregado modernizou a empresa, instalou computadores, redistribuiu novas tarefas aos demais empregados, acrescentou modernidade à oficina da firma visando a maior lucro, ditava ordens, tudo isso com o consentimento do patrão que via o colaborador com bons olhos e se orgulhava do seu trabalho administrativo.

 

O comerciante ascendeu a uma camada social mais alta. Era visto como exemplo de quem subiu na vida pelo mérito do trabalho e da competência, embora a elite lhe fizesse restrições, por ser ele mecânico, e por seu comportamento social que contrariava as regras de convivência por ela adotada.

 

No aniversário do chefe, muito badalado, o funcionário, agora chefe de vendas, deu o melhor e mais caro presente ao aniversariante. Chamou a atenção dos colegas a ostentação e a generosidade do perdulário que passou, também, a frequentar a “soçaite”. Mas ninguém tinha a petulância de denunciar as suspeitas, por receio da incompreensão do empregador, alegando inveja do sucesso do rapaz. Cientificaram, então, os familiares mais íntimos do ricaço, que passaram a investigar o dito.

 

O indigitado, nos finais de semana, ia a sua cidade para rever os parentes, conforme alardeava. Foi, porém, flagrado com a boca na botija. Levava no carro várias peças, as de maior valor. Contumaz no delito, já havia montado uma casa de peças e comprado imóveis, tudo surrupiado do novo-rico que cria na honestidade do empregado que o decepcionou por adquirir riqueza ilícita à sua custa.

 

Ingenuamente, destituído de qualquer malícia, não comunicou à polícia o furto ocorrido, não quis se vingar do larápio. Ficou constrangido, pois, não esperava dele procedimento criminoso. Ganhava o suficiente para não se perverter. Ocorre que o cachimbo é que põe a boca torta, e a facilidade é que faz o ladrão. O larápio sentiu-se estar com a faca e o queijo nas mãos para a prática da ilicitude.

 

O patrão descobriu que o larápio cultivava uma poupança gorda. Tratou de reaver esse dinheiro. Mediante essa providência, o ladrão cara de pau, ameaçou processá-lo, por falta de provas, coagindo o ex-patrão de exigir indenização por danos morais. Agiu de má-fé.

 

Ao prestigiar o empregado novato em detrimento dos demais, cometeu erro imperdoável − menosprezo e incredulidade na competência dos demais –, acreditando piamente na experiência e no talento do funcionário que terminou por enganá-lo. Há de se conscientizar da falibilidade do homem. “Quem vê cara não vê coração”. É preciso confiar, contudo não se pode abrir mão de se fiscalizar, essa praxe é infalível.

 

 

Antonio Novais Torres.

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Brumado, em 18/10/2010.