O cheiro não poderia ser mais familiar: um humano certamente está por ali. Atraído pelo aroma, o Aedes aegypti vai em direção ao seu alvo, todo serelepe. Ao chegar lá, é sugado por uma armadilha e morre por desidratação.
Como essa, outras emboscadas tecnológicas para mosquitos, bloqueadores magnéticos de janela e até exemplares do bichinho geneticamente modificados estão disponíveis para qualquer cidade do país – e até para ter em casa – adquirir em breve. Tudo será apresentado na 1ª Feira de Soluções para a Saúde e Seminário Internacional da Unicef: Zika e Infância, que começa nesta terça-feira (8) e vai até quinta-feira (10), no Senai-Cimatec, no bairro de Piatã, em Salvador.
“Essa feira é uma idealização das pessoas que estão enfrentando esse problema das arboviroses no Brasil inteiro. Desde 2014, passamos a ter a recrudescência dessas doenças e o aparecimento de novas epidemias. Em 2014, foi a chikungunya, em 2015, foi a zika, além da febre amarela retornando. Estamos juntando todas as pessoas para discutir como enfrentar essas arboviroses e as consequências delas”, explicou o secretário estadual da Saúde, Fábio Vilas-Boas, ao CORREIO.
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Cerca de mil pessoas são esperadas por dia – a participação é gratuita e a inscrição pode ser feita no site, embora aqueles que chegarem ao local poderão entrar de qualquer forma. O público alvo vai desde estudantes, lideranças comunitárias, pesquisadores e associações de pacientes até representantes de associações de moradores e síndico de condomínio.
“Todas as pessoas são muito bem-vindas. A participação da sociedade civil é fundamental”, convidou o secretário. A feira é promovida a partir de uma parceria com a Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz), a Secretaria Estadual da Saúde (Sesab) e a Federação das Indústrias da Bahia (Fieb).
Bons mosquitos
Uma das iniciativas que será discutida é o Aedes do Bem, que será apresentado nesta quarta (9). Desenvolvido em pela empresa Oxitec, o projeto começou a ser implantado no Brasil justamente na Bahia – nas cidades de Jacobina, no Centro-Norte do estado, e de Juazeiro, no Vale do São Francisco.
Os primeiros testes do Aedes do Bem no Brasil foram realizados na Bahia: em Juazeiro e Jacobina (Foto: Reprodução/Facebook) |
De acordo com a cientista da Oxitec Cecília Kosmann, o Aedes do Bem é uma linha de mosquitos do Aedes aegypti que passou por modificações genéticas – ou seja, são mosquitos transgênicos. “Eles são iguaizinhos (aos selvagens), mas têm dois genes a mais. Um desses genes é o que realmente faz a população ser reduzida, porque faz com que o mosquito limite sua vida. Ele produz uma proteína, que não é toxina, nem veneno, mas é produzida em excesso”, explica a cientista. Essa produção constante faz com que, lá pelo quarto ou quinto dia de vida, a larva morra.
“Eles são iguaizinhos (aos selvagens), mas têm dois genes a mais. Um desses genes é o que realmente faz a população ser reduzida, porque faz com que o mosquito limite sua vida.” (Cecília Kosmann, cientista, sobre o Aedes do Bem)
Os Aedes do Bem são sempre machos, porque são as fêmeas que picam e que transmitem doenças para a população. O macho vai, então, em busca da fêmea – que, por sua vez, só cruza uma vez na vida, chegando a colocar entre 200 e 300 ovos. “Se ela cruza com o Aedes do Bem, toda a prole dela vai herdar o gene autolimitante”, ilustra. Enquanto a fêmea só cruza uma vez, o mosquito macho não tem esse limite.
Enquanto o primeiro gene é sintético, o segundo é extraído de um coral fluorescente – e é ele que permite identificar qual é o Aedes do Bem. Sob uma luz específica, o mosquito transgênico fica fluorescente. Fora isso, os dois mosquitos – selvagem e modificado – são iguais. “Fazendo liberações sucessivas, ao longo de um período, a gente consegue ir reduzindo a população do Aedes”, explica Cecília.
Redução da infestação
Em Jacobina e em Juazeiro, a redução da população de mosquitos chegou a variar entre 92% e 99%, a depender da localidade. Em Piracicaba (SP), onde o projeto foi implementado em 2014, após os testes na Bahia, a experiência em um bairro de cinco mil pessoas que registrou epidemia de dengue foi de 80%. “Devido aos resultados, a prefeitura de lá resolveu expandir o Aedes do Bem para toda a região central de Piracicaba. São 11 bairros, onde vivem 65 mil pessoas”, conta a cientista.
Para liberar os mosquitos, uma equipe da Oxitec segue, numa van, em direção a pontos pré-definidos por GPS. “Vamos andando por todas as ruas do bairro e, a cada 100 metros, liberamos aproximadamente mil mosquitos na fase de intervenção”. A distância é devido ao raio de voo do mosquito, que fica entre 100 metros e 200 metros.
“Vamos andando por todas as ruas do bairro e, a cada 100 metros, liberamos aproximadamente mil mosquitos na fase de intervenção.” (Cecília Kosmann, cientista, sobre técnica usada para liberar insetos transgênicos)
Depois, a quantidade de mosquitos liberados pode diminuir – na fase de ‘manutenção’. Cecília reforça que nenhuma tecnologia pode garantir que vai erradicar por completo o mosquito. “Ele pode até ‘acabar’ num determinado local por um determinado tempo, mas o mosquito viaja de avião, de navio, então qualquer ferramenta de controle vetorial é feita continuamente”, adverte.
O projeto pode ser contratado por qualquer prefeitura ou governo. O valor vai depender muito da realidade encontrada – inclusive da população de mosquitos, que é monitorada semanalmente. Só para dar uma ideia, o valor cobrado em Piracicaba é de R$ 30 anuais por pessoa.
Conforto e praticidade
Mas quem quiser enfrentar o mosquito em sua própria casa terá opções como a Mosquifim, que criou uma armadilha ecológica capaz de atrair os insetos. O produto usa uma tecnologia que produz uma reação química que imita o cheiro humano. Os mosquitos são atraídos e, posteriormente sugados. Assim, os insetos morrem por desidratação.
A Mosquifim é uma armadilha que atrai os mosquitos pelo cheiro, que lembra o aroma de humanos (Foto: Divulgação) |
“O ideal é para o público geral mesmo. Estamos bem no começo, vendendo apenas pela internet. Na feira, vamos começar a divulgar e abrir uma rede de representantes. A Mosquifim é uma empresa pequena, familiar e com perspectiva de poder ajudar no combate aos mosquitos”, conta o proprietário e gerente da empresa, Peter Oechsle.
Há dois modelos de armadilha: uma menor, ideal para interiores e casas, que custa R$ 109; o segundo, que abrange até 300m², custa R$ 299. De acordo com ele, a tecnologia foi importada da Coréia da Norte e trazida pelo Brasil em 2009. A empresa tem sede em Santa Cruz Cabrália, no Sul do estado.
“Estamos bem no começo, vendendo apenas pela internet. Na feira, vamos começar a divulgar e abrir uma rede de representantes.” (Peter Oechsle, empresário, sobre o Mosquifim, armadilha que atrai insetos através de odor)
Depois de produzir o primeiro teste rápido para detecção da zika no Brasil, a Fundação Baiana de Pesquisa Científica e Desenvolvimento Tecnológico, Fornecimento e Distribuição de Medicamentos (Bahiafarma) vai mostrar, na feira, uma nova versão do projeto. De acordo com o secretário Fábio Vilas-Boas, o novo teste será capaz de detectar, de uma só vez, zika, chikungunya e dengue.
“Esses novos testes serão apresentados ao Ministério da Saúde. Eles serão distribuídos gratuitamente e poderão ser feitos em qualquer posto de saúde. Em 20 minutos, a tirinha vai analisar o sangue e mudar de cor para cada doença”, afirma o secretário. Ele não soube dizer qual é a previsão para que os novos testes estejam disponíveis na rede pública de saúde.
Conheça algumas das soluções que serão apresentadas na feira
1. Aedes do Bem – Criado pela Oxitec, o projeto chegou ao Brasil em 2010 – e os testes começaram justamente na Bahia. O Aedes do Bem é um mosquito macho geneticamente modificado que tem um gene autolimitante: com isso, a vida do macho, que não transmite a doença, é limitada. Ao cruzar com uma fêmea, os futuros mosquitos vão nascer já com o gene sintético.
2. Armadilha ecológica para mosquito – Criada pela empresa Mosquifim, é uma tecnologia para atrair os insetos produzindo uma reação química que imita o cheiro humano. Os mosquitos são atraídos e, posteriormente sugados. Assim, os insetos morrem por desidratação.
3. Adultrap – Outra armadilha que consegue detectar preventivamente quem é o mosquito Aedes aegypti. Ela consegue capturar e prender a fêmea adulta, que é justamente quem transmite as doenças.
4. Block Insetos – É uma tela mosquitoeira fixada com imã em qualquer janela. A proposta é vedar integralmente a janela, bloqueando a entrada de poeira e insetos – só passa o ar fresco.
5. Teste de detecção rápida – O teste para zika da Bahiafarma foi o primeiro a ser desenvolvido por um laboratório público brasileiro, no ano passado. Agora, será apresentada uma nova versão do teste – que testará para dengue, zika e chikungunya. O resultado sai em 20 minutos.
6. Estação Disseminadora de Larvicida – Projetado pela Fiocruz da Amazônia que usa as próprias fêmeas para disseminar larvicida. Elas são atraídas a baldes com água com paredes recobertas com o plano com larvicida em pó. Quando pousam na superfície, as partículas se aderem ao corpo do inseto. Como elas visitam muitos criadouros, acabam disseminando a substância.
7. Cadeiras de plástico adaptadas para crianças com microcefalia – Foram desenvolvidas em um projeto de extensão no curso de Fisioterapia da Universidade Federal de Pernambuco (UFPE), para adaptar cadeiras de plástico, tornando-as adequadores posturais de baixo custo.
8. Toxicidade de plantas medicinais nas larvas do Aedes – Avalia o efeito dos extratos das plantas popularmente conhecidas como erva-cidreira e eucalipto em larvas do Aedes aegypti. O projeto está sendo desenvolvido pelo Colégio Estadual Geovania Nogueira Nunes, de Itatim, no Centro Norte baiano.
O projeto da escola de Itatim analisa a toxicidade de plantas medicinais sobre as larvas do Aedes (Foto: Reprodução) |
9. Vacina contra a dengue – Está sendo desenvolvida pelo Instituto de Tecnologia em Imunobiológicos (Bio-Manguinhos), da Fiocruz, uma vacina com o vírus inativado.
10. Vacina contra a zika – Conduzido pelo Instituto Butantan, o estudo sobre a vacina de vírus vivo atenuado foi a abordagem definida como a mais efetiva porque tem todas as propriedades necessárias para indução da resposta imune protetora.
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