TSE decide seguir com investigação sobre campanha de Dilma; entenda o que está em jogo

 

 presidente e vice

O Tribunal Superior Eleitoral (TSE) decidiu na noite desta terça-feira (6) dar prosseguimento a mais uma ação contra a campanha da presidente Dilma Rousseff movida pelo PSDB e a coligação que apoiou a candidatura de Aécio Neves, candidato derrotado nas eleições de 2014.

Cinco dos sete ministros votaram pela continuidade do processo – a Ação de Impugnação de Mandato Eletivo (AIME) 761.

Os ministros julgaram um recurso do PSDB contra a decisão da ministra relatora do caso, Maria Thereza de Assis Moura, que havia decidido em fevereiro pelo arquivamento dessa ação. Ela considerou que a coligação de Aécio Neves não apresentou provas suficientes contra a campanha de Dilma.

Quando os tucanos recorreram ao plenário, porém, Gilmar Mendes abriu divergência e decidiu pela continuidade do processo – outros três ministros o acompanharam: João Otávio de Noronha, Henrique Neves e Luiz Fux.

Eles argumentaram que o avanço da Operação Lava Jato trouxe outras evidências contra a campanha da presidente. Faltavam as manifestações de Luciana Lóssio e Dias Toffoli, o atual presidente do TSE – na sessão da corte desta terça, ela votou pelo arquivamento da ação e ele, pela continuidade.

A BBC Brasil preparou um guia sobre o que significam esses processos e que consequências podem ter:

O que está em jogo no TSE?

No final do ano passado, o TSE aprovou as contas de campanha da chapa Dilma Rousseff-Michel Temer com ressalvas. No entanto, segundo a professora de Direito Eleitoral da FGV-Rio Silvana Batini, isso não tem qualquer relevância no sentido de comprovar se a campanha da presidente foi correta ou não.

Ela explica que o processo de prestação de contas no TSE é meramente formal e tem de ser concluído muito rapidamente, antes da diplomação dos candidatos, em dezembro.

“É uma conferência formal da contabilidade. A candidata declara a doação da empresa, o TSE confere se tem o recibo e aprova. O que a prestação de conta não afere é se aquela doação veio ou não de dinheiro desviado da Petrobras”, exemplifica.

Dessa forma, nota a professora, há outros tipos de ações que permitem investigar irregularidades na campanha e julgar se um mandato deve ou não ser cassado. Essas ações servem para apurar se houve abusos que desequilibram a disputa, como doações irregulares e uso da máquina pública.

O PSDB moveu quatro ações desse tipo (AIJE 154781, AIJE 194358, AIME 761 e RP 846). Nesses processos, o partido aponta supostos episódios de uso da máquina pelo governo na campanha de Dilma, como participação indevida de ministros e envio de 4,8 milhões de folders pró-Dilma pelos Correios.

Também cita a operação Lava Jato e a possibilidade de recebimento de doações de empreiteiras envolvidas em desvios de recursos da Petrobras, o que caracterizaria abuso de poder econômico.

No âmbito das ações de investigação judicial eleitoral (AIJEs) já foram inclusive colhidos alguns depoimentos. O empreiteiro Ricardo Pessoa, dono da UTC, foi um dos convocados, mas se manteve calado.

Na prática, as quatro ações podem ter o mesmo resultado – cassar o mandato de Dilma Rousseff e Michel Temer. Esses são os principais processos que correm no TSE contra a presidente e seu vice.

Já a prestação de contas (PC 97613) foi reaberta pelo ministro relator Gilmar Mendes, sob a justificativa de que novos indícios de irregularidades vêm surgindo, conforme avança a apuração da Lava Jato.

O que pode resultar em uma condenação?

Batini ressalta que, para haver condenação de Dilma no TSE, é preciso ficar provado que as eventuais irregularidades levantadas nas quatro ações interferiram no resultado do pleito.

“Para que isso aconteça (a cassação da presidente), é preciso que a Justiça reconheça que aquele abuso teve uma gravidade muito grande que de fato tenha ameaçado a legitimidade da eleição e a liberdade do voto”, disse.

“Outra possibilidade é que eles reconheçam que não houve abuso ou que houve abuso, mas não foi grave o suficiente”, explicou.

No caso do escândalo de corrupção da Petrobras, por exemplo, teria que ser provado que o dinheiro desviado foi usado especificamente na campanha da presidente, ressalta o advogado Alberto Rollo, presidente do Instituto de Direito Político Eleitoral e Administrativo.

Quanto tempo deve levar para uma decisão final do TSE?

A Justiça Eleitoral é mais rápida que a Justiça Comum. Isso acontece porque é preciso ter uma decisão antes do término do mandato, que na maioria dos cargos é de quatro anos (apenas o de senador dura oito). Uma decisão no sentido de cassar um mandato, se proferida após seu término, não teria eficácia.

“É imprevisível se a ação (contra Dilma) vai durar seis meses, um ano, um ano e meio. Agora, dá para dizer que vai ser julgada antes de terminar o mandato (da presidente)”, afirma Rollo.

“O rito previsto no Código Eleitoral é mais rápido que o previsto no CPC (Código de Processo Penal): oferece menos possibilidade de recursos, os recursos não têm efeitos suspensivos”, acrescenta.

No entanto, ressalta o advogado, o julgamento também não pode ser instantâneo porque é preciso dar tempo para a coleta de provas e para que o acusado possa se defender.

“Até para mostrar para a sociedade que a decisão não é uma decisão política. É uma decisão jurídica, fundamentada em provas. Não é questão de eu gosto da presidente ou não.”

Segundo Batini, não é há parâmetros que permitam prever quanto tempo vai durar as ações contra Dilma e Temer. Ela nota que os processos que já foram julgados contra governadores, por exemplo, não servem de comparação porque nesses casos o processo começa no TRE (Tribunal Regional Eleitoral) e depois há recurso para o TSE, o que potencialmente torna o trâmite mais longo.

O processo que resultou em 2009 na cassação do então governador do Maranhão, Jackson Lago, por exemplo, durou pouco mais de dois anos.

A palavra final é do TSE?

Os dois especialistas ouvidos pela BBC Brasil entendem que, após o TSE proferir sua decisão, a defesa ainda poderia recorrer ao Supremo Tribunal Federal (STF).

“Cabe um recurso dentro do TSE, chamado embargo de declaração, e com certeza um recurso extraordinário ao Supremo”, afirma Batini.

No caso de uma eventual decisão do TSE no sentido de cassar Dilma, a tendência é que a presidente seja mantida no cargo enquanto são analisados os recursos, acredita Rollo.

“O recurso ao STF não tem efeito suspensivo automático. Mas dá para pedir o efeito suspensivo, e aí é bem razoável, eventualmente, que seja aceito. Enquanto não julga no STF, é bom deixar a presidente lá (diante da relevância do cargo)”, ressalta Rollo.

Se Dilma e Temer forem cassados, o que acontece?

Com cassação de Dilma e Temer, Eduardo Cunha assumiria a Presidência interinamente.

Diferentemente de um processo de impeachment, que pode derrubar a presidente isoladamente, uma decisão do TSE no sentido de cassar Dilma necessariamente implicaria também na cassação de Temer.

Se ambos forem destituídos de seus cargos pela Justiça Eleitoral, Rollo acredita que prevalecerá o conteúdo da Constituição Federal: o artigo 81 prevê expressamente que, na hipóteses de os cargos de presidente e vice ficarem vagos, será realizado novo pleito para escolha dos sucessores.

Caso a cassação ocorra antes que se complete metade do mandato (ou seja, até dezembro de 2016), a Constituição estabelece que uma nova eleição terá que ser realizada após 90 dias. Nesse intervalo, o presidente da Câmara, atualmente Eduardo Cunha, assumiria a Presidência interinamente.

No entanto, se uma eventual cassação de Dilma e Temer acontecer a partir de 2017, a eleição será indireta – após 30 dias o Congresso escolherá dois parlamentares para ocupar os cargos.

Batini também acredita que, em caso de cassação, devem ser convocadas novas eleições. Ela nota, porém, que há decisões da Justiça Eleitoral, em ações contra prefeitos e governadores, que empossaram o segundo colocado. Foi o caso da cassação de Lago em 2009, quando Roseana Sarney assumiu o governo do Maranhão, sem realização de nova eleição.

Mariana Schreiber
Da BBC Brasil em Brasília