Em tempos de ataques à ciência, pesquisadores da Bahia figuram entre os mais influentes do mundo

Produção científica baiana ganha destaque internacional e reafirma o papel social da universidade

Em tempos de ataques à ciência, pesquisadores da Bahia figuram entre os mais influentes do mundo

Foto: Sandra Travassos/ Metropress

 “As universidades são caras e têm a ver com politicagem, ideologização e balbúrdia”. Quem dera ouvir novamente a palavra “balbúrdia” sem lembrar desses absurdos ditos pelo Ministro da Educação escolhido pelo então presidente (e atual réu por tentativa de golpe de Estado y otras cositas más) Jair Bolsonaro. Não têm sido tempos fáceis para os que fazem ciência no Brasil. E ainda assim, 107 pesquisadores brasileiros estão entre os que mais influenciam políticas públicas e tomadas de decisão mundo afora. Quatro deles, revela o relatório inédito Bori-Overton publicado no início de novembro, estão filiados a universidades baianas.

A maior parte dessas pesquisas foi citada em decisões sobre Ecossistemas e Uso da Terra, o que coloca o Brasil na centralidade do debate ambiental global. Não à toa, nosso email encontrou alguns deles a caminho da COP30, que acontece neste momento em Belém, no Pará. Maurício Lima Barreto, um dos responsáveis pela criação do Instituto de Saúde Coletiva da Ufba – de excelência reconhecida internacionalmente –, acredita numa produção científica feita em colaboração direta com a comunidade. “A universidade não é um castelo separado da sociedade, mas é parte dela. É importante essa demonstração”, afirma.

Em outras palavras, a ciência produzida no Brasil têm influenciado ações concretas, capazes de promover mudanças reais para o povo. Blandina Felipe Viana, professora do Instituto de Biologia da Ufba e mencionada em pelo menos 250 documentos, encontra nesse reconhecimento o senso de dever cumprido, mas faz questão de lembrar que “é fruto de muitas parcerias, de trabalhos em rede, no respeito e na responsabilidade. Ninguém constrói nada sozinho”.

Desigualdades que resistem

Os desafios enfrentados não são poucos. A escassez de recursos, a dificuldade de manter financiamento, a sobrecarga e um mercado de trabalho altamente competitivo fazem parte da rotina, num cenário de negacionismo. O relatório da Bori-Overton também evidencia algumas desigualdades importantes. Além da concentração em universidades do eixo sul–sudeste, de uma lista de 107 cientistas citados, apenas 22 são mulheres.

Juliana Hipólito, citada em mais de 200 documentos estratégicos, pesquisadora do Instituto Nacional da Mata Atlântica (Inma) e professora na Ufba, se tornou mãe no ano que terminou o doutorado e essa coincidência transformou sua trajetória de forma significativa. “Já fui excluída de convites para colaborações e trabalhos precisamente porque ‘tinha meu filho para cuidar’, como se a maternidade fosse incompatível com excelência científica”, confessou. Já Blandina Felipe Viana sente que é preciso se esforçar o dobro para ser levada à sério – mesmo quando se ocupa cargos e posições de poder dentro da academia, numa área em que mais da metade dos cientistas são mulheres: “percebo desigualdades sutis no reconhecimento e nas oportunidades”.

A verdade é que, enquanto houver ataques à democracia, haverá ataques à universidade. Se o pensamento livre e a reflexão crítica são entendidos como balbúrdia, que a Bahia continue no centro dessa confusãoConteúdo Juliana Lopes