ACADEMIA DO PAPO – Paulo Pires – Quem mora nas cidades é feliz?

 

paulo-pires            Um autor americano – o nome agora me foge – escreveu um livrinho interessante cujo texto faz exaltação à felicidade que reside no espírito das pessoas que vivem nas cidades. Isso mesmo. O autor recorre a outros autores e fontes, incluindo nessas até uma velha canção alemã [lied] para repetir em suas estrofes que “felizes são aqueles que moram nas cidades”.  De agrado [ou seja, como um tira-gosto] ainda cita um provérbio alemão “stadtluft macht frei” [o ar da cidade torna um homem livre].

            É óbvio que Elomar, se leu ou lesse o texto deploraria o conteúdo (o genial criador tem ojeriza à vida nas cidades). E para manifestar seu desagrado com a vida urbana cunhou até uma expressão: Urbanóides. Em contraposição deu o nome de Roçalianos para quem mora no campo.  Quer saber? Acho que o Bode está correto. A vida nas cidades é uma verdadeira tormenta e tem nos tornado um bando de paranóicos, esquizofrênicos e debilóides.

 E por que a vida nas cidades está tão desregrada? Por que viver nas cidades é estar exposto a acontecimentos desagradáveis. Até sair e voltar prá casa tornou-se uma aventura perigosa, uma tenebrosa experiência humana. Concorda? ou como diria o pastor Edir Macedo: “Sim ou não?”.

Os motivos para que a vida nas cidades tenha se tornado um desassossego são os mais variados. Se começarmos pelo provérbio alemão, temos que lamentar a obsolescência do seu conteúdo: Nem mesmo metaforicamente o “ar da cidade” é algo que nos faz sentir o gosto da liberdade. Estamos presos. Não há mais dúvida: Nas cidades estamos presos. Cada momento em uma metrópole é um perigo. Até mesmo no interior de um shopping ninguém está seguro. É assalto a joelharia, a banco, estação de trem, metrô. Uma bomba do ETA um estrondo da Al Qaeda, um tiroteio de Chechenos, um gatuno de periferia. Onde, como e quando estamos seguros?

Há poucos dias, em frente ao Banco do Brasil, agência centro de Conquista, dois sujeitos pararam em uma moto. O carona saltou feito um felino sobre um moço que estava portando um malote empresarial. Pimba! O sujeito da moto deu uma cacetada na cabeça do que estava com o malote.  Todo mundo correu pensando que era briga. Em uma ação de trinta segundos o ladrão levou da empresa algo em torno de 16 mil reais.  Plena luz do dia.

Como os nossos velhos políticos nos atrasaram adoidados estamos revivendo no Brasil o período identificado como fim da baixa Idade Média início da Renascença, onde os relatos sobre salteadores eram freqüentes. Nas Estalagens as narrativas sobravam sobre os facínoras. As pessoas viviam sobressaltadas e era um Deus nos acuda.

No Brasil de hoje, a coisa anda mais ou menos no mesmo nível. É verdade que isso não pode ser levado em conta apenas nos tempos atuais. Vem de muito tempo. Ou melhor, foi construído há muito. Nossos modelos e ciclos econômicos fizeram o País desaguar nesse pântano social onde a cidadania cada dia se encolhe em seus direitos e a cada momento vive indiferente às suas obrigações.

Não há cidades perfeitas. Os problemas das metrópoles se somam e se multiplicam.  São espectros geo-espaciais com deficiências múltiplas: Ora estruturais, ora sociais, ora morais, ora mentais, etc. etc. Mudar a mentalidade de uma sociedade não é tarefa fácil. No caso da mudança de mentalidade, por incrível que pareça, quando se trata do terreno fértil das coisas supérfluas, ocorre até com facilidade. Basta um poderoso sistema de comunicação como a televisão apresentar novos modelos de prestígio e, pasmem, dia seguinte, olha o Povão copiando o novo modelo. Isso é que é duro.  O dado concreto, como dizia um ex-presidente, é que os problemas se apresentam com características locais, mas na realidade são globais. Estouram em cadeia mundial e respingam particularmente no local. É no local, ou seja, na cidade, onde vive o homem que a coisa degringola. Seu ponto de referência, sua identidade histórico-social é e está na cidade. Ninguém diz: Meu endereço é Rua 14, Planeta Terra.  Nós vivemos no Globo, mas não o temos como referência para o Sedex. Voltando às cidades cabe perguntar: Elas foram bem planejadas? As cidades foram previamente pensadas para tanto carro? Em 1930 o filósofo espanhol Ortega & Gasset alertava para a explosão da Indústria automobilística. Mas ele era apenas um Filósofo. As pessoas não ouvem os Filósofos. As pessoas ouvem cantores Pop. Os habitantes do Planeta parecem pouco atentos ao que lecionam quem sabe das coisas. A esperança é que um dia tenhamos aprendido a dar valor a quem efetivamente merece. Nesse tempo, como diria o ambientalista André Cairo, a lógica e a razão serão ressuscitados.