“Não se deixem enganar pelos cabelos brancos, pois os canalhas também envelhecem” – Rui Barbosa.
Tem aquele humano cachorro, fiel e amigo do dono; tem o cachorro desumano traiçoeiro e feroz que rouba até alimento das escolas das pobres crianças e remédios nos hospitais; tem o abandonado nas ruas e favelas passando fome e sede como muitos humanos; e tem o cachorro de luxo que vive paparicado, numa mordomia sem igual, de fazer inveja à maioria dos brasileiros que passam privações. Na outra encarnação, se é que existe, confesso que quero ser o de luxo.
Cachorro agora não é mais cachorro, como antigamente, é um filho e melhor que o humano. Não azucrina a cabeça dos pais. Para os afortunados, o pet shop faz parte da família. Humano pode comer transgênico, mas cachorro não. Agora são rações especiais grain-free (livres de grãos). Para algumas raças, o alimento tem que ser vitaminado para a pelugem. Para eles, os cachorros, roupas de festa, pastas de dente com sabor, casinha no formato de Casa Branca dos Estados Unidos, sapatos para não queimar as patas e tapete gelado para se refrescar.
Nos tempos atuais de tantas inversões de valores, onde o homem está mais preocupado em salvar as baleias e as tartarugas do que o planeta e a si mesmo do monstro da indiferença e do apego ao consumismo supérfluo, onde criaram uma série de mimos e confortos para cães e gatos com tratamento vip, o baiano Valdick Soriano, na maior das suas fossas, não cantaria: Eu não sou cachorro não, pra viver tão humilhado e desprezado. Cantaria: Eu quero ser um cachorro pra viver tão bem cuidado.
É sério! Não é conversa fiada não! Já observou a linha de produtos entre roupas, sapatos, brincos, sabonetes, cosméticos em geral, remédios caros, comidas, vitaminas, brinquedos, doces e bibelôs criados pela indústria capitalista para satisfazer os cachorros de ricos e madamas que vivem em seus apartamentos e mansões? Não existe crise para o setor de pets shops. O faturamento das empresas só faz crescer porque a cada dia inventam um novo produto para os privilegiados, tipo Classe A.
Para não entrar em depressão profunda e até morrer de tédio, deveria ser proibido pobre ver ou ler na mídia notas e matérias sobre como os cachorros das dondocas, poderosas e poderosos em geral são tratados. Aniversário desses bichos é um deslumbre de imagens, coisa de outro mundo de fantasias dos sonhos, com parabéns, fitas, tapetes, comidas preparadas por chefes cozinheiros, fotos, discursos, recitais de poemas, shows de cantores, apresentação de danças, palhaços, humoristas e presentes de toda cachorrada humana e desumana.
É, meu amigo! Cabeleireiro, massagista, manicure, terapeuta, estilista, psicólogo e filósofo de cachorro estão matando a pau no mercado, sem falar nos veterinários, casas de abrigo, de férias, spas e hotéis para a cachorrada, com fins de corrigir traumas e estresses. Ele está dormindo! Silêncio! Vida de cachorro é bom demais! Humilhado e desprezado somos nós pobres mortais, Valdick Soriano! Eu não sou humano não, para ser tão maltratado e abandonado, assim deve cantar um cachorro quando sentir que lhe faltou a devida consideração de carinho e cuidado por parte do seu dono ou dona.
Tem cachorro em academias aprendendo judô, karatê e outras lutas marciais, para se defender de seus colegas, certamente bandidos que enveredaram pelo caminho da marginalidade por falta de oportunidades na vida social. Têm muitos que fazem balé e aprendem a dançar o samba e o pagode para não fazer feio numa feijoada batucada.
Está na solidão num final de semana em casa, sem um amigo para tomar umas geladas? Não se apoquente porque agora você já pode dividir uma cerveja de domingo com seu fiel cachorro, ou um molho de carne na comida. Mas, não fique assim tão contente porque só poucos vão poder fazer isso. É que os gastos não vão caber nos bolsos de todo mundo.
É isso aí mesmo! Alegria de pobre dura pouco. Segundo levantamento da Associação Brasileira da Indústria de Produtos para Animais de Estimação, o custo médio mensal para manter um cão com produtos-padrão se situa em torno de R$300,00. Para gatos, chega a R$120,00. A depender da classe social, os valores podem representar até 24% da renda média mensal do brasileiro.
Por falar em bichanos, têm uns aqui que infernizam minha vida dia e noite no nosso telhado. Os donos que não têm condições de mantê-los em suas casas com alimentos e cuidados deveriam ser processados e levados para cadeia. Eles quebram nossas telhas e fazem um barulho do inferno. Eles têm proteção da sociedade dos animais, mas nós não. Temos que suportar tudo calados.
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