Fraternos: Veja detalhes do esquema que teria desviado R$ 200 mi desde 2008

por Bruno Luiz

 

Foto: Marcelo Camargo/ Agência Brasil

Apontados como líderes do núcleo político da organização criminosa investigada na Operação Fraternos, os prefeitos afastados de Eunápolis, Robério Oliveira, de Porto Seguro, Cláudia Oliveira, e de Santa Cruz Cabrália, Agnelo Santos, todos do PSD, atuaram desde 2008 até os dias atuais no extremo sul baiano. De acordo com o despacho da juíza Rogéria Maria Castro Debelli, do Tribunal Regional Federal da 1ª Região, cuja parte havia sido divulgada pelo Bahia Notícias na quarta-feira (8) (veja mais detalhes aqui), a quadrilha agia de três formas. Uma delas era simular concorrência entre os participantes do núcleo empresarial, sem subcontratação. Assim, empresas participavam da licitação, mediante ajuste da vencedora, emulando a existência da concorrência e, depois, destinavam os recursos a servidores e outras pessoas físicas e jurídicas. Outra maneira de atuação era fazer a mesma simulação, mas com subcontratação. A diferença é que a organização fracionava a execução do serviço licitado e subcontratava as empresas vencedoras do certame. Ainda de acordo com as investigações, a terceira forma era simular a concorrência, mas fazendo pagamentos àquelas organizações que faturavam a licitação, em contrapartida pela participação formal dos certames. O despacho também mostra qual seria a participação dos prefeitos e também de Sílvio Naziozeno Santos e Edna de Souza Alves Santos, supostos componentes do núcleo político do esquema. Robério foi quem fez, em 2008, no primeiro mandato à frente da prefeitura de Eunápolis, a primeira contratação de uma empresa apontada como integrante da organização criminosa, a Litoral Sul. Enquanto chefe do Executivo Municipal, ele ainda firmou diversos contratos com empresas pertencentes à Orcrim, como a OMG Construtora LTDA, Litoral Sul Serviços Técnicos Especializados e a TWA Construções e Empreendimentos. Esta última teve como representante legal, durante um tempo, Agnelo Santos, na época em que ele foi secretário de Finanças de Eunápolis. A TWA participou de várias licitaçõe na cidade. Atualmente, tem como donos Naia Belanisia de Jesus Santos e Tainan Belanísia de Jesus Santos, alvos de mandados de prisão na operação deflagrada na terça (7). Segundo o documento, Agnelo recebeu entre 2013 e 2016, como titular dono da Peixoto Santos Terraplanagem, diversos depósitos de empresas contratadas pela prefeitura de Porto Seguro, entre elas a própria TWA, a LTX Empreendimentos Construções e Steel Empreendimentos e Serviços. Neste período, o município era governado por sua irmã, Cláudia Oliveira. A partir de 2013, a prefeita afastada também selou contratos com as empresas, caso da Litoral Sul Serviços Técnicos Especializados, de propriedade de Sílvio Naziozeno, alvo de mandado de prisão. Ele, por sua vez, era homem de confiança do casal de prefeitos. Foi assessor da prefeitura de Eunápolis, onde permaneceu em funções de confiança até 2008. Conforme o despacho, “há evidências de que Cláudia Oliveira Santos e Agnelo Silva Santos Júnior foram beneficiados de diversos repasses de valores de empresas contratadas pela prefeitura de Porto Seguro, com passagem desses recursos de forma simulada em outra empresa denominada Peixoto Santos Terraplanagem”. Seguindo a linha do tempo do suposto esquema, em 2009, Naziozeno deixou as funções públicas e passou a representar a empresa Axé Eventos LTDA, que tem como sócias Cláudia e a filha dela, Larissa Oliveira. Ele recebeu uma procuração que o autorizava a representar os interesses da família. Nessa mesma época, o acusado passou a ser também sócio da empresa Mineração Porto Seguro, que teria sido usada para lavar mais de R$ 16 milhões. Ele, então, passou a receber na sua conta bancária pessoal e na da empresa repasses oriundos da Litoral Sul. Só com essas transações, o investigado teria embolsado R$ 990,2 mil. O valor é alvo de suspeita da PF e do Ministério Público Federal, que alega não haver justificativa para a transferência de tantos recursos, já que “não há correlação entre o objeto contratado pelas prefeituras com a empresa Litoral Sul (locação de máquinas, equipamentos e veículos para apoio aos serviços de limpeza urbana, com as atividades da Mineração Porto Seguro LTDA, fornecedora de materiais para construção como cimento, cal e brita)”. Em 2013, Nazioneno volta a ocupar funções públicas, desta vez como Superintendente de Obras Públicas (2013) e de Projetos Especiais (2014-2015), ambos os cargos na prefeitura de Porto. Neste período, apontam as apurações, a Litoral Sul foi novamente contratada, desta vez para realizar coleta de lixo, e repassou a ele, mensalmente, R$ 8 mil. Já em 2017, o acusado volta a trabalhar para a família Oliveira. Com a volta de Robério ao governo de Eunápolis, Naziozeno é nomeado Diretor de Terraplanagem e Pavimentação, com a função de fiscalizar os serviços da empresa Katharina Transporte e Locação de Máquinas, que tem como um dos donos Isac Santos Joaquim Boaventura, conduzido coercitivamente. Ainda na série de laços familiares que permeia os investigados na ação, James Almeida Mascarenhas, preso temporariamente e sócio da Litoral Sul, é tio-avô de Marcos da Silva Guerreiro, um dos coordenadores do grupo empresarial que teria perpetrado as irregularidades. Guerreiro também aparece listado como objeto de prisão temporária. O despacho mostra ainda que, além de um dos chefes do núcleo político, Agnelo também coordenaria o núcleo empresarial da quadrilha. Ele era acompanhado de Ricardo Luiz Rodrigues Bassalo e Guerreiro. Bassalo ainda é ex-esposo de Margarete Marinho Santos, pivô da investigação. O ex-casal foi alvo de mandado de prisão temporária. Os investigadores descrevem também que o núcleo empresarial da Orcrim é formado, possivelmente, por 33 pessoas e 17 empresas. Entre elas, 20 pessoas foram objeto de pedido de prisão temporária. Além dos casos citados pela reportagem, foram alvos também Antonio Fernandes Pastore, Azeuane Belanísia de Jesus Pires, Caique Max da Costa Santos, Deneson Marcio Rodrigues Bassalo, Douglas Guerreiro Santos, Hebert Jofre Santos Pinto, João Lázaro de Assis de Souza, José Roberto Andrade de Oliveira, Márcio Almeida Passos, Marcio Puig, Maria José de Seus Santos, Rafaela Santos Reis e Vagner da Conceição do Espírito Santo. Sobre o esquema, o MPF afirma que é possível aferir uma “articulação constante” entre os núcleos. “Ao longo desses anos, houve articulação para a realização fraudulenta dos procedimentos licitatórios e apropriação ou desvio de verbas públicas com a consequente lavagem de dinheiro. Tais agentes se articulam na preparação de documentos e declarações para ocultar e dissimular os frutos e produtos dos crimes”. E segue descrevendo os processos de lavagem de dinheiro. “Assume relevância as vultosas quantias de saques de dinheiro em espécie em bancos diversos por pessoas físicas, possivelmente para permitir a livre fruição independentemente dos crimes antecedentes, o que deve ser interrompido imediatamente”, sustenta o órgão ministerial. Após análise dos autos, a juíza Rogéria Debelli assevera: “Como se pode observar do contexto fático até o momento, há indícios suficientes de supostos crimes cometidos contra a União”. Segundo a PF, de 2008 a 2017, as fraudes movimentaram mais de R$ 200 milhões.