Gaspari: ‘Cabral e Dilma culparam os outros e o povo’

Ricardo Moraes/Reuters

 

Nos desastres em que os fenômenos naturais misturam-se à inatural omissão humana, muita gente se salvará quando for adotada uma providência simples.

 

Consiste em incluir nos avisos funerários e nos rodapés das lápides os nomes dos gestores públicos (municipais, estaduais e federais) que governaram a catátrofe.

 

Nas pegadas do flagelo do Rio, a expressão mais ouvida foi a de que se estava diante de um morticínio tonificado por “omissões históricas”.

 

Exagerando-se na tática do retrovisor, pode-se chegar a Pedro Alvares Cabral. Na coluna que leva às páginas deste domingo (16), inclusive as da Folha, o repórter Elio Gaspari sugere um atalho à rota das caravelas:

 

“Sérgio Cabral e Dilma Rousseff poderiam atender ao pedido que Carlos Lyra e Vinicius de Moraes encaminharam a Xangô: ‘Pôr pra trabalhar gente que nunca trabalhou’.”

 

Abaixo, três pedaços –um grande e dois menores— extraídas da torta servida por Gaspari:

 

 

 

“No ano passado, quando as chuvas provocaram a morte de 148 pessoas em Angra dos Reis e na Ilha Grande, o governador Sérgio Cabral estava em sua casa de Mangaratiba, a pouco mais de uma hora da cena das tragédias, e levou mais de um dia para dar o ar de sua graça. Veio com uma lição:
‘Eu não faço demagogia. Houve um tempo em que governador aparecia ao lado de traficante, como se ele fosse o John Wayne. Aqui, estavam dois secretários da área. Quem deve vir são as autoridades públicas que podem de fato dar solução e comando ao problema’.
Como dizia John Wayne, ‘o amanhã é a coisa mais importante da vida’. A conta de 2010 fechou com 316 mortos, passou-se um ano, e as chuvas voltaram. Desta vez, Sérgio Cabral não estava em Mangaratiba, mas no exterior.
Quando desembarcou no Rio, já haviam sido contados mais de 300 corpos por conta de temporais que começaram dois dias antes. (Os mortos passaram de 500.)
Ao chegar, Cabral contrariou sua lição de 2010 e visitou as áreas afetadas. Foi acompanhado pela doutora Dilma Rousseff, que ensinou: ‘A moradia em área de risco no Brasil é a regra, não é a exceção’.
Falta explicar por qual critério Dilma e Cabral definem ‘áreas de risco’. O centro de Friburgo? A cidade de Areal? Bairros urbanizados onde viviam pessoas que pagam IPTU?

 

Em 2010, a explicação demofóbica para a morte de mais de 30 pessoas no morro do Bumba, em Niterói, sustentou que a patuleia estava em cima do que fora um lixão. Estava, com a permissão da prefeitura, e ninguém foi responsabilizado.
A essa explicação, somou-se a do catastrofismo ambiental. Para quem gosta de falar em calamidades climáticas, vale lembrar que, na Austrália, onde choveu mais do que no Rio, os mortos foram 25 e há dezenas de desaparecidos.
Como no ano passado, os governantes anunciaram esmolas para já e planos para amanhã. Daqui até janeiro do ano que vem, Sérgio Cabral e Dilma Rousseff poderiam atender ao pedido que Carlos Lyra e Vinicius de Moraes encaminharam a Xangô: ‘Pôr pra trabalhar gente que nunca trabalhou’.

 

– Área de risco: Na quarta-feira, reunido com sua equipe em Brasília, o secretário nacional de Defesa Civil, doutor Humberto Viana, informou que uma das prioridades de seu mandarinato será a construção da sede própria para a repartição. Àquela hora havia mais de dez mil pessoas desabrigadas no Rio. Na linha da doutora Dilma, pode-se dizer que Secretaria de Defesa Civil é uma área de risco na administração federal.

– Dia D: Um consolo para o governador Sérgio Cabral, com seu pendor pelas analogias militares. No dia do desembarque aliado na Normandia (6 de junho de 1944), o marechal Rommel, comandante das fortificações alemãs na costa da França, estava na Alemanha. Viajara para comemorar os 50 anos de sua