Gilberto Gil já cantou que mistério sempre há de pintar por aí. Mas um deles em especial intriga os fãs da MPB há mais de dez anos. Por que Gal Costa e Maria Bethânia não se falam durante todo esse tempo? O mistério voltou à tona nos últimos dias com a estreia do documentário “O nome dela é Gal”, uma homenagem aos 50 anos de carreira da cantora de “Meu bem, meu mal”.
No fim do primeiro episódio, Bethânia, que admitiu surpresa ao ser convidada para dar um depoimento, entrega que há muitos anos as duas não se encontram. A última vez foi quando, em 2002, elas se juntaram a Caetano Veloso e Gilberto Gil para uma reedição dos Doces Bárbaros, que marcara a carreira do quarteto nos anos 1970.
O silêncio só foi quebrado uma única vez na ocasião da morte de Dona Canô, há quase cinco anos. Gal Costa mandou uma mensagem de pêsames para Maria Bethânia pela perda da mãe (a história é contada no documentário). A cantora estaria retribuindo o mesmo carinho que Bethânia teve com ela, comparecendo ao velório de Dona Mariah Costa, mãe de Gal, em 1993. “Nessa época, as duas já estavam afastadas. Embora tenham até dividido o palco, algumas vezes, depois disso. Após Doces Bárbaros, elas passaram a não conviver mais”, revela um produtor musical.
As cantoras começaram praticamente juntas (Bethânia um pouco antes) na década de 1960. Na época, em Salvador, em meio a revolução de costumes, ensaiaram um namoro. Quando viajavam em turnê, dividiam o mesmo camarim. Os meninos, Gil e Caetano, ficavam em outro. A rivalidade, mais alimentada pelos fãs e pela mídia, sempre existiu. Uma era conhecida pela voz; a outra, pela dramaticidade.
Era a interpretação de Maria Bethânia para a canção “Um índio”, de autoria do irmão, o momento mais aplaudido da apresentação que os quatro faziam juntos. “O índio só desce uma vez por noite”, costumava brincar Bethânia nos bastidores, no fim de cada apresentação.
Já no Rio, as duas moravam no mesmo bairro, em São Conrado, mas não se frequentavam. Bethânia, na casa que vive até hoje, na Estrada das Canoas. Assim que foram construídos edifícios na região, Gal mudou-se para uma cobertura — perto de outra cantora, Simone.
A especulação imobiliária, com vários prédios altos surgindo, acabou com a vista que a irmã de Caetano tinha do mar. Gal Costa, anos depois, ainda se mudaria para Trancoso e, em seguida, para Salvador. Hoje, mora em São Paulo. A distância entre as duas passaria a ser também geográfica.
A última vez que Maria Bethânia assistiu a uma apresentação de Gal Costa foi em 1981, no show “Fantasia”, no extinto (e saudoso) Canecão. É de conhecimento de todos, no entanto, que ela é avessa a badalações. Nunca é vista em eventos ou estreias. “Quando Moreno, o primeiro filho de Caetano, nasceu, ele teve que levar o menino para Bethânia conhecer”, lembra um amigo próximo: “Ela não gosta de sair de casa, é seu refúgio”.
Quando Gal Costa ficou alguns anos sem lançar disco ou fazer show, depois do lançamento de “Hoje”, em 2005, o curioso é que foi Maria Bethânia uma das incentivadoras do seu retorno. Ela e alguns amigos, incluindo Caetano Veloso, pediram que o compositor José Miguel Wisnik fosse ao encontro dela e tentasse convencê-la a voltar. A iniciativa não teve sucesso, e Gal só retornaria em 2011 com “Recanto”, incentivada por Caetano.
“Elas não se falam nem no aniversário. Difícil dizer se houve de fato uma briga, algum desentendimento. Talvez seja uma questão íntima, que só mesmo elas sabem”, acredita um músico. Neste domingo, Maria Bethânia completa 71 anos. E deve passar o dia sem o “parabéns” da antiga amiga. Tem mistério que dura para sempre.
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