Após dois anos com registro recorde de casos de febre amarela, representantes do Ministério da Saúde já apontam risco de novo aumento na transmissão da doença no próximo verão. Segundo o diretor de doenças transmissíveis, Renato Alves, o alerta ocorre diante da baixa cobertura vacinal e da confirmação de novas mortes de macacos infectados pelo vírus.
Na última semana, o instituto Adolfo Lutz confirmou a morte de três macacos por febre amarela no Parque Estadual da Serra do Mar, em Caraguatatuba, no litoral de São Paulo. Antes, já haviam sido encontrados macacos mortos em Ubatuba e no Vale do Ribeira. Todos os casos ocorreram durante o inverno. “Vemos que o maior número de casos humanos foi entre dezembro e fevereiro. No entanto a detecção em primatas tem se mantido ao longo de todo o ano”, diz Alves. “Isso indica que no próximo verão devemos ter uma transmissão importante”, afirma.
Em 2017, a cobertura vacinal acumulada de febre amarela atingiu pouco mais de metade da população, ou cerca de 57,5%. Neste ano, a cobertura atinge 61%. Os baixos índices e a avaliação do governo sobre o risco de novos casos da febre amarela já haviam sido divulgados pela Folha de S.Paulo no especial “E agora, Brasil?”. Agora, a confirmação de novas mortes em macacos relacionadas à doença reforçaram o alerta. “Temos um grande risco de um novo surto. Está tudo indicando para isso. Não há nenhuma indicação de que vamos ter um recrudescimento da circulação”, afirma a coordenadora do Programa Nacional de Imunizações, Carla Domingues. Um dos motivos para esse alerta, afirma, é o próprio histórico de “ciclos” da doença. “A cada vez que temos um pico epidêmico, vemos que ele fica de dois a três anos. Estamos indo para o terceiro ano, em uma área de alta transmissão”, diz.
Diante do risco, autoridades de saúde discutem novas medidas que podem ser adotadas. O tema foi alvo de reunião nesta quinta-feira (30) entre Ministério da Saúde e representantes de estados e municípios. Uma das estratégias em análise é enviar um alerta a todas as cidades com baixas coberturas vacinais para que apresentem um plano para reverter os índices. Segundo Domingues, o ministério também planeja ampliar a vacinação, até o fim deste ano, para toda a região Sul. Até então, a região ainda tinha cidades fora da lista daquelas que fazem parte da área de recomendação de imunização contra a doença. “Estamos orientando os municípios para que façam essa ampliação da vacinação de forma gradativa. Temos que fechar a área de risco de transmissão, e o Sul tem esse risco. É uma vacinação preventiva onde há corredores ecológicos”, afirma ela, que lembra que a vacinação também foi ampliada recentemente em outros locais, como São Paulo, Rio de Janeiro e Bahia.
Atualmente, 4.266 cidades fazem parte da área de recomendação da vacina. De acordo com a coordenadora, não há previsão de ampliar a vacinação para outras regiões, como o Nordeste. No ano passado, o ministério chegou a anunciar a intenção de ofertar a vacina para crianças de nove meses em todo o país. A ampliação da imunização para adultos também foi cogitada. Domingues, no entanto, diz que as condições na época eram outras -o que faz com que a medida esteja descartada neste momento. “Isso foi pensado em um momento em que não tínhamos transmissão de febre amarela na velocidade que depois se demonstrou [nos últimos anos]. O cenário hoje é outro”, afirma.
Questionada sobre a possibilidade da pasta adotar novamente o fracionamento da vacina, Domingues diz que a medida dependerá da circulação do vírus no próximo verão. Ela defende que municípios invistam em ações de busca ativa de não vacinados como forma de evitar o desperdício de doses. Hoje, a estimativa é que, de cada frasco de vacina, apenas 30% das doses sejam utilizadas. Isso ocorre porque há um prazo limite de até seis horas para uso das doses após a abertura de cada frasco. Em momentos de surtos, a taxa de uso chega a 70%. “A população só procura a vacina na hora que tem aumento de casos. Precisamos mudar essa cultura”, diz. “Há oportunidade de buscar nos próprios serviços pessoas a serem vacinadas.”
Apesar da necessidade de aumentar a adesão, a coordenadora alerta que a vacina não é indicada a crianças menores de seis meses, gestantes, pacientes imunodeprimidos e pessoas com alergia grave a ovo, entre outros casos.Já idosos devem avaliar possíveis riscos e benefícios em conjunto com o médico.
por Natália Cancian | Folhapress
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