Com a prevalência das negociações coletivas sobre o legislado, a reforma trabalhista, que entra em vigor em menos de uma semana, vai exigir novas formas para fortalecer sindicatos e outros órgãos de representação classista. A alteração em pontos da Consolidação das Leis Trabalhistas (CLT) enfraquece a representatividade das entidades ao tirar a obrigatoriedade da sua participação nas homologações de contratos, demissões, na negociação de acordos e também torna opcional o pagamento do imposto sindical que, em muitos casos, é a fonte de recursos dessas entidades.
São mudanças que deixam dúvidas não só para o trabalhador, mas também para os sindicatos. Na prática, antes das medidas serem efetivadas, o acordo só prevalecia sobre a lei se fosse mais favorável ao empregado. Caso a lei fosse mais vantajosa, ela ficaria acima da norma coletiva. “O movimento sindical terá que fazer mudanças na sua organização de base, na estrutura e no modo como conduz campanhas e negociações coletivas. Ele deve fortalecer sua capacidade de ser um escudo protetor dos trabalhadores”, pontua o diretor técnico do Departamento Intersindical de Estatística e Estudos Socioeconômicos (Dieese), Clemente Ganz Lúcio.
A partir de agora, os trabalhadores ficam menos dependentes dos sindicatos e mais expostos à necessidade de uma organização coletiva dentro da própria empresa. Para Lúcio, o movimento sindical deve repensar sua atuação para aumentar sua representatividade. “A visão a partir do coletivo dos trabalhadores, nas suas diversas formas, deve se sobrepor ao conceito fragmentado de categoria – uma ideia que hoje divide os trabalhadores”, diz. “Os sindicatos vão ter de repensar a comunicação, fundamentar econômica e socialmente as suas reivindicações, conhecer o perfil da base, a estratégia econômica das empresas e do setor. Os desafios se ampliam”, completa.
Sem os sindicatos, os trabalhadores poderão escolher três funcionários que os representarão em empresas com, no mínimo, 200 funcionários na negociação com os patrões. Esses representantes não precisam ser sindicalizados. “O fracasso nas negociações poderá representar o aumento dos conflitos e o desgaste das relações, o que diminui a capacidade de dar solução por meio do diálogo”, defende o diretor do Dieese.
Com a reforma surgem ainda os acordos individualizados, em que empregados com instrução de nível superior e salário mensal igual ou superior a duas vezes o limite máximo dos benefícios do INSS (R$ 5.531,31) podem negociar diretamente com o patrão um acordo específico que irá prevalecer sobre o coletivo.
Assim, o que for negociado não vai precisar ser incorporado ao contrato de trabalho ou ser validado pela Justiça para vigorar. Os representantes dos trabalhadores e das empresas poderão dispor livremente sobre os prazos de vigência dos acordos e convenções, bem como sobre a manutenção ou não dos direitos previstos quando expirados os períodos de vigência. “Os trabalhadores saberão construir os caminhos para responder à fragilização da representação coletiva”, acredita Lúcio.
Organização sindical
Para o presidente da Central Única dos Trabalhadores na Bahia (CUT-BA), Cedro Costa e Silva, a não obrigatoriedade do imposto sindical não é o maior problema no momento, até porque a contribuição se mantém indispensável para os filiados. “O importante é barrar a reforma. O imposto sindical nunca foi problema. Queremos uma contribuição que seja negociada junto com os trabalhadores”, afirma, antes de completar: “Estamos recolhendo em todo o país mais de 1,3 milhão de assinaturas para barrar essas mudanças na CLT”, afirma.
Questionado sobre o papel dos sindicatos a partir do príximo dia 11, Cedro diz que a tendência é a de que as entidades dialoguem mais com a base. “Os sindicatos não estão parados. Fica muito difícil o trabalhador reivindicar alguma coisa do patrão com medo de perder o seu emprego. Quem negocia acordo coletivo de trabalho é o sindicato”.
O presidente da Central dos Trabalhadores e Trabalhadoras do Brasil na Bahia (CTB-BA), Aurino Pedreira, concorda: “Estamos na luta de resistência. Os sindicatos vão ter que se organizar e permanecer cada vez mais próximo do chão de fábrica e no ambiente de trabalho. Com certeza, a gente não vai sair de perto do trabalhador”.
De acordo com o secretário-geral da Força Sindical, João Carlos Gonçalves Juruna, as mudanças serão discutidas nas negociações coletivas. “Estamos apostando neste enfrentamento para garantir todos os direitos dos trabalhadores. Precisamos aprimorar a nossa atuação e nos reinventar a partir dessas reações coletivas”, considera.
Resistência à reforma dificulta acordos coletivos
O coordenador do Conselho de Relações Trabalhistas da Federação das Indústrias da Bahia (Fieb), Homero Arandas, destaca a dificuldade que o setor está enfrentando com as convenções e acordos coletivos que estão vencendo neste mês de novembro por conta da resistência dos sindicatos à reforma trabalhista. “Está sendo exigido das empresas que as medidas da reforma não sejam adotadas, como por exemplo a terceirização da atividade fim e as mudanças no cálculo do banco de horas. São ajustes que precisam ser feitos antes da lei começar a vigorar. As partes precisam chegar a um acordo”, diz.
Ele pontua ainda que, com as mudanças na CLT, os sindicatos vão precisar se reinventar. “A lei tem pontos polêmico sim, mas não tira direitos
dos trabalhadores. Tanto os sindicatos patronais como o dos trabalhadores terão que prestar um bom serviço para estimular a sindicalização”, afirma.
No ponto de vista do setor agropecuário, o ganho da reforma está na agilidade no fechamento dos acordos, como ressalta o vice-presidente da Federação da Agricultura e Pecuária do Estado da Bahia (Faeb), Humberto Miranda. “Vai evitar algumas situações, como a de sindicatos que as vezes não representavam a verdadeira vontade do trabalhador e interferiam negativamente nas negociações. Com a relação mais direta entre produtor e trabalhador fica mais rápido atender as vontades dos dois lados. A defesa do emprego tem que estar fortalecida para que a gente possa sair da situação difícil que o país passa”.
Segundo Kelsor Fernandes, represente da Federação do Comércio de Bens, Serviços e Turismo do Estado da Bahia (Fecomércio-BA) na Comissão Nacional de Negociação Coletiva, a participação do sindicato continua sendo necessária nas negociações. “O sindicato vai ter que achar outros caminhos de custeio a partir de agora, mas ele continua sendo um elo importante na negociação patrão-empregado, só que de uma forma mais dinâmica e proativa”, acrescenta.
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