Em 2022, o livro do professor Mozart Tanajura fará 30 anos de publicação
Neste último final de semana, ao voltar de uma caminhada, meu filho, Davi, me disse: “pai, tomara que você esteja vivo quando Conquista fizer 200 anos”. Sim, tomara, meu filho! E com alguma saúde, até. Todavia, como somos humanos e por jamais saber se estarei vivo até terminar esse texto e tampouco daqui a nove anos, se não estiver, por favor, permitam-me, uma indicação. E esta é para breve.
Brevíssimo, diria, porque em novembro de 2022, o livro “História de Conquista: crônica de uma cidade”, do professor Mozart Tanajura fará 30 anos de publicação. E, sim, merece uma reedição; aliás, uma edição crítica segundo os métodos da moderna crítica textual para estabelecer um texto mais perfeito, modernizar a pontuação, corrigir os erros tipográficos e, claro, substituir o sistema ortográfico pelo atual, anotar e sublinhar variantes e (possíveis) passos obscuros.
Tudo, obviamente, respeitando escrupulosamente a língua, as formas, a fonética do tempo e do autor. E, finalmente, o livro merece uma nova edição porque “História de Conquista” já se tornou um tópos e, por isso mesmo, aparece com frequência em muitos trabalhos historiográficos — acadêmicos ou não.
E, claro, que se realce também a proficuidade do trabalho de Mozart, cuja obra somente se encontra hoje em algumas xerox por aí ou ainda na biblioteca virtual do Instituto Ibero-Americano de Berlim mas, por conta de direitos autorais, nem todas as páginas podem ser lidas on-line.
“História de Conquista: crônica de uma cidade” foi publicado em novembro de 1992 e, em breves comentários, representa o acúmulo de cerca de duas décadas de pesquisas e reúne a narrativa dos fatos sobre o ambiente em que se assentou o primeiro núcleo urbano local, passando pelo mito originário da fundação do arraial, a expansão econômica do século XX, até a Conquista moderna em finais de 1980.
Há-de se notar que antes desta edição, Mozart já possuía textos sobre a história de Vitória da Conquista publicados em periódicos e tinha um vasto repertório de anotações e de fontes, além de uma grande produção literária que incluía poesias, contos e crônicas. No entanto, boa parte de sua obra continua inédita.
O filho do escritor, José Mozart Tanajura Filho, nos dá notícia de pelo menos 4 livros importantes não publicados: “Almanaque de Província, além da História” (feita em colaboração com o poeta Carlos Jehovah), “Breve História da Literatura Conquistense”; “O Arcaísmo na Zona Rural” e “Memorial da Prefeitura: paço municipal, quartel e cadeia”.
Sobre este último, houve intenções de publicá-lo em 2013 porém sem sucesso. O estudo conta a história do prédio que abriga a sede da Administração Municipal e o projeto inicial de edição reunia várias imagens desde de 1894 até anos mais recentes, selecionadas nada mais nada menos que pela fotógrafa Edna Nolasco, falecida recentemente em 11 de novembro.
Dentre as poesias de Mozart Tanajura, cabe mencionar “O Homem e a sua Fome”; “O Ouro da Inconfidência”; “Poema do Entardecer” e, talvez a mais famosa delas, o “Noturno de Vitória da Conquista” que volta e meia circula na internet na voz maviosa do radialista Gilson Moura (1937-2012).
Falecido em 24 de maio de 2004, o professor José Mozart Tanajura nasceu em 14 de setembro de 1936 em Livramento de Nossa Senhora e ainda jovem veio morar em Vitória da Conquista. E, além de muitíssimo interessando na nossa história, era um grande defensor da memória e da obra do poeta Camillo de Jesus Lima.
Um ano antes de morrer, em 2003, Mozart Tanajura publicou na Revista Conquista News um artigo intitulado: “Camillo à beira do esquecimento”. Hoje, infelizmente, também vale para o professor a mesma asseveração de Ruy Medeiros sobre o poeta feita em 2014, afinal Mozart era bastante conhecido de seus contemporâneos mas são poucos os que hoje em dia tiveram acesso a sua obra. Enfim, a memória de um e de outro é pouquíssimo celebrada.
— Aliás, sobre Camillo, permitam-me um comentário. Em julho de 2018, quando da reinauguração do Centro de Cultura Camillo de Jesus, tivemos de fazer uma reparação ao poeta pois o seu nome estava com a grafia errada em todas as placas que havia no espaço. Em uma delas, inclusive, estava escrito CAMILIO (sic).
Mas, voltando ao livro de Mozart, tenho uma relação curiosa com ele. À época do seu lançamento, eu ganhei um exemplar do diretor da emissora de rádio em que trabalhava, Ivan Lemos, e, como outros três volumes estavam por ali esquecidos e sem despertar interesse de nenhum dos colegas, acabei ficando com quatro exemplares.
Porém, na sucessão de empréstimos sem devoluções (e de juras solenes dos prestadores de que não emprestei), atualmente tenho apenas um exemplar que o filho do autor me confiou a guarda. Ou seja, livro emprestado é livro estragado…
Em campo acadêmico, há uma discussão sobre os limites teoréticos e científicos da publicação, se se trata de obra historiográfica mesmo, de livro de crônicas ou de paralipômenos. E eu próprio tenho algumas querelas com o livro e uma delas trata-se da apresentação feita pelo ex-prefeito Murilo Mármore, exarada em letra de próprio punho. Ilegível…
Afinal, como dizia Mário de Andrade, meu sentimento é pachorrento e gosto um tanto dos meus descansos. E sempre me pergunto ao tomar o livro nas mãos: por que não transpuseram o texto, Deus meu?
Mas, há outro provérbio que diz que um livro fechado é apenas um bloco de papel. Então, que uma nova edição favoreça novos debates.
Que outros leitores possam ler as questões próprias de José Mozart Tanajura e sugerir novas questões e novas formas de investigação na resultante própria da reescrita da história. Porque, lembrando Maria Helena Rolim Capelato, as revisões historiográficas acadêmicas (ou não) fazem parte das atribuições do ofício de historiador.
E, tal como afirmava Dostoiévski, não há assunto tão velho que não possa ser dito algo de novo sobre ele. Então: por uma edição crítica da “História de Conquista: crônica de uma cidade” já! E que publique-se também os demais livros do autor.
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