O projeto que flexibiliza as regras do licenciamento ambiental pode também se debruçar sobre as regras acerca de autorizações para mineração.
Atualmente no Senado, a proposta busca alterar as regras para o processo de licenciamento ambiental em nível federal, mas também estadual e municipal.
Por exemplo, ele regulamenta para todo o país a LAC (Licença por Adesão e Compromisso), um termo autodeclaratório de que o empreendimento está de acordo com as regras exigidas, e estipula prazos máximos para esses processos.
Críticos afirmam que a LAC vai servir como um “autolicenciamento” e que o limite de tempo vai inviabilizar a análise de casos mais complexos. Defensores, por outro lado, dizem que a proposta vai desburocratizar os procedimentos e dará segurança jurídica para os empreendimentos.
Atualmente o projeto tramita em duas comissões concomitantemente, a de Agricultura e a de Meio Ambiente, sob relatoria de Tereza Cristina (PP-MS) e Confúcio Moura (MDB-RO), respectivamente.
A expectativa é que o tema seja pautado nas comissões nas próximas semanas, e a intenção é que seja construído um texto em comum, mas até agora os dois vêm divergindo sobre uma série de pontos.
O último relatório apresentado por Confúcio, por exemplo, agradou ambientalistas ao reduzir a flexibilização aos processos de licenciamento. Cristina, no entanto, quer um relatório com menos alterações possível.
Parlamentares e integrantes do governo de Luiz Inácio Lula da Silva (PT) também veem a aprovação da proposta como importante para dar celeridade às obras do Novo PAC.
A tendência é que o texto se aproxime mais do que defende a ex-ministra da Agricultura do governo de Jair Bolsonaro (PL), que pretende que a proposta seja bastante semelhante à aprovada na Câmara dos Deputados em 2021 —alvo de críticas de ambientalistas.
Como o texto deve sofrer alterações, mesmo que pequenas, o projeto precisará passar novamente apreciação dos deputados caso seja aprovado no Senado.
Nos últimos debates, ganhou força a possibilidade de o texto passar a tratar também sobre mineração, ou pelo menos aplicar as regras gerais do licenciamento ao setor.
A inclusão, ou não, da mineração dentro das regras gerais do licenciamento ambiental é motivo de discussão desde que o projeto foi aprovado na Câmara.
Inicialmente, o texto não tinha termos relacionados a qualquer atividade. Ou seja, as regras seriam aplicadas a todos os setores.
Quando a proposta chegou ao plenário, no entanto, foi feito um acordo para incluir um dispositivo retirando “empreendimentos minerários de grande porte e/ou de alto risco”. Esses deveriam seguir regras específicas, em razão de sua complexidade e especificidade.
O acordo, à época, foi que a atividade teria suas regras para autorização e estudos ambientais tratados em um projeto de lei específico.
Ainda não está certo como serão feitas as alterações no projeto do licenciamento ambiental que foi aprovado na Câmara, mas parlamentares já dão como certo que pelo menos o dispositivo excludente será retirado. Um grupo defende, sob reserva, que a proposta se debruce mais detalhadamente sobre o setor.
Procurados, nenhum dos dois relatores se manifestou até a publicação desta reportagem.
O Ibram (Instituto Brasileiro de Mineração) afirma que o dispositivo colocado pela Câmara fere a isonomia legislativa e cria insegurança jurídica.
“Essencial o retorno do setor ao texto considerando todo o seu potencial basilar para a promoção de políticas públicas voltadas à proteção do meio ambiente —incluindo a flora, a fauna, o clima e a cultura regional, à sustentabilidade social das comunidades próximas aos territórios minerados e ao desenvolvimento econômico das cadeias produtivas”, afirma a entidade, em nota.
Mas a possibilidade segue contestada por ambientalistas.
Suely Araújo, ex-presidente do Ibama (Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais e Renováveis), chama o projeto do licenciamento ambiental de a “mãe de todas as boiadas”, por flexibilizar as regras que deveriam garantir a proteção ambiental.
“As regras mais flexíveis presentes na proposta da lei geral [do licenciamento] não são condizentes com os riscos associados aos empreendimentos minerários”, afirma.
O licenciamento minerário hoje é atribuição federal apenas em casos específicos, por exemplo, quando é próximo à fronteiras estaduais ou nacionais, entre outros casos. Na maioria das vezes, são os estados que devem analisar a viabilidade desses empreendimentos.
Assim, há uma série de normas diferentes pelo Brasil para o funcionamento de minas.
Maurício Guetta, consultor jurídico do ISA (Instituto Socioambiental), entende que a inclusão da mineração pode causar novas tragédias como as de Mariana e Brumadinho, ambas em Minas Gerais.
“O projeto é a maior tragédia legislativa em curso contra o meio ambiente, pois resultará em descontrole generalizado da poluição e demais impactos ambientais causados por toda ordem de empreendimentos”, afirma.
“A exclusão da mineração de grande porte ou alto risco feita na Câmara se deu justamente porque alertamos sobre o radicalismo antiambiental da proposta. Incluí-la novamente só vai ampliar ainda mais os riscos contra a saúde, a vida e a segurança da população”, completa.
Já o Ibram afirma que, desde as tragédias mencionadas, o setor passou por diversas melhorias, inclusive no que diz respeito à construção de barragens, e que tais atualizações estão contempladas, por exemplo, em normas da ANM (Agência Nacional de Mineração).
“A mineração passou por profundas transformações em níveis de gestão, segurança operacional, transparência, boas práticas internacionais”, diz o instituto, em nota.
João Gabriel/Folhapress
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