Em entrevista à Tribuna, ele falou sobre as eleições de outubro, o atual cenário político no Brasil e os três pontos principais da sua gestão
Governador da Bahia, Rui Costa (PT) caminha para concluir o seu 2º ano de mandato e acredita que está no caminho certo para ser reconhecido como o gestor que deu o pontapé para revolucionar a educação no estado.
Em entrevista à Tribuna, ele falou sobre as eleições de outubro, o atual cenário político no Brasil e os três pontos principais da sua gestão.
“Há a corrosão do tecido social, está esgarçado. Acho que o 1º grande passo para a gente resolver o problema é se o conjunto da sociedade encarar que esse não é um problema do governo, é um problema nosso. Eu tenho falado muito de família e de fé, porque são dois pilares que ajudam a estruturar qualquer sociedade.”
Tribuna – O senhor assumiu a gestão encarando três desafios como prioritários: saúde, educação e segurança. O que lhe deu mais trabalho até agora, qual evoluiu mais e qual lhe tira mais o sono?
Rui Costa – São três áreas que você tem que ter atuação e atenção de forma permanente, não pode descuidar. Das três, eu diria que a mais difícil é a questão da segurança pública, porque não depende só das suas ações. A saúde, se você melhora a estrutura, constrói policlínicas, hospitais, como estamos construindo, faz mutirões, como vamos fazer de cirurgia eletiva, vai ser lançado agora em agosto e em um prazo de 12 meses vamos ultrapassar a marca de 20 mil cirurgias eletivas.
Ou seja, você muda o padrão de atendimento, o padrão de serviço. Na educação, nós acabamos de assinar um convênio com o Senai Simatec, somos um dos estados com maior número de matrículas de ensino profissionalizante, temos mais de 70 mil alunos matriculados.
Resolvemos utilizar a tecnologia, o material didático, tudo que o Senai Simatec tem produzido. Eles têm anos de história no ensino profissionalizante e vamos integrar as nossas ferramentas com material deles.
Vamos iniciar uma grande reforma de escola, enfim. Você vai fazendo e vendo o resultado. Depende da sua capacidade de investimento, mas vai fazendo e vendo o resultado aparecer.
Tribuna – Falta mais investimento na segurança?
Rui Costa – Na área de segurança nós temos feito investimentos muito grandes. Trocamos 1.500 viaturas, contratei dois mil policiais militares novos, acabei de chamar 639 agentes e delegados da Polícia Civil, abrindo vagas de presídio, até o fim do mês estamos abrindo o presídio de Vitória da Conquista, nos próximos meses já temos concluídas as obras de quatro mil vagas de novos presídios, mas aqui o resultado não depende apenas das suas ações.
Você depende de um conjunto de fatores que influenciam na segurança pública. Não é à toa que nós temos um problema hoje, eu diria no país inteiro sem exceção, os indicadores são muito graves de segurança pública.
No ano passado deve ter morrido no Brasil quase 70 mil pessoas assassinadas. Não existe país em guerra no mundo que mate tanta gente. Nós vivemos uma epidemia de calamidade pública. Eu mandei fazer uma pesquisa social, um diagnóstico, com os que foram assassinados em 2014. A maior parte das vítimas, que também coincide com a grande maioria dos autores desses crimes, têm idades entre 12 e 29 anos. Então, aos 12 anos já tem menino morrendo e menino matando.
Você observa as famílias, geralmente esses meninos têm uma desestruturação familiar muito grande e, por tanto, é um problema de tecido social. Não é um problema de governo, deste ou daquele governo. Você olha no país, independente do partido ou do perfil de cada governo, o problema é o mesmo e os números se repetem, com pequenas diferenças.
Nos estados do Nordeste, a média é de 40 homicídios por cada 100 mil habitantes. Na média não tem muita diferença, tem a oscilação, uma hora um tá melhor, o outro pior, mas na média tá todo mundo mais ou menos na mesma condição.
Tribuna – O poder público tem perdido a queda de braço contra a marginalidade?
Rui Costa – Eu não diria o poder público. Essa é uma das formas, que eu diria da minha pregação, que tenho feio no interior, e aqui na capital, em entrevistas que dou. Nas minhas andanças, eu digo assim para as pessoas: isso não é um problema do poder público, um problema do estado. É um problema da sociedade.
A sociedade está com um grande problema. Há a corrosão do tecido social, está esgarçado. Acho que o primeiro grande passo para a gente resolver o problema é se o conjunto da sociedade encarasse que não é um problema do governo nem da sociedade, é um problema da sociedade, nosso. Eu tenho falado muito de família e de fé, porque são dois pilares que ajudam a estruturar qualquer sociedade.
Outro dia eu estava com um embaixador de um país africano cuja maioria da população é de muçulmanos. Um país que é muito mais pobre que o Brasil e a Bahia, com indicadores sociais muito ruins. Eu perguntei sobre violência, sobre drogas. Ele disse: ’não, não tem isso lá não’. Não é um fenômeno expressivo, é residual. Eu perguntei por que, ele disse que talvez porque 70% da população seja de mulçumanos e 30% de católicos fervorosos.
Então, você tem uma base social, no caso lá se consolida através da religiosidade, muito sólida, não permitiu que a droga entrasse com força. Você tem uma matriz que não é policial, não é a da força. É a da crença em uma coisa muito além desse mundo que a gente vive aqui. Isso faz com que as pessoas adotem um padrão de comportamento.
Tribuna – A droga é o maior problema?
Rui Costa – Quando eu falo das drogas, digo que é uma questão de problema social, porque o consumo das drogas aumentou muito no país inteiro e nesse levantamento que eu fiz, dois terços das pessoas que foram a óbito tinham envolvimento direto ou indireto com as drogas. Não necessariamente com o tráfico, mas com o consumo e não pago. Alguém que comprou, usou, não pagou e o rapaz que vendeu foi cobrar a dívida. E se não tem dinheiro para pagar, paga com a vida para servir de exemplo.
Além de uma matança grande entre os controles desses pontos de droga. Quando eu digo que não é um problema somente do estado ou do poder público, é um problema da sociedade, todos nós temos que encarar primeiro a questão da família, o cuidado que temos que ter com as crianças. Cada dia mais encontramos crianças de dez, 12 anos envolvidas com as drogas.
Não tem uma semana sequer aqui que eu passe sem a polícia prender meninos de dez, 11, 12 anos com arma na mão. A polícia está fazendo o seu trabalho, mas está encontrando armas na mão de meninos de dez, 11 anos.
Tem alguma coisa errada isso não é um problema de poder público somente, é um problema de sociedade. Uma coisa é a família não conseguir segurar alguém de 20 anos, 25 anos que decidiu caminhar para o lado errado. Outra coisa é o núcleo familiar não segurar uma criança de dez anos.
Tribuna – Em pouco mais de um ano e meio de governo dá para dizer que o senhor acertou na escolha de 100% da sua equipe?
Rui Costa – Eu diria que um treinador quando vai escolher os jogadores em campo, é fácil avaliar depois quem está jogando melhor e quem está jogando menos, mas antes, quando escalou, evidente que queria que todos estivessem jogando igual. Mas é claro que em uma partida, um joga melhor que o outro, e depois acontece o inverso.
Eu diria que a avaliação é positiva, uma equipe que está empenhada, motivada. Ajustes pontuais, ou por mudança política, ou administrativa, foram feitos e podem ser feitos a qualquer momento. Mas no geral, eu estou satisfeito.
Tribuna – O que o senhor gostaria de ver nessa segunda metade do seu governo?
Rui Costa – O que eu realmente queria mudar não depende de mim, depende da conjuntura econômica do país. Eu gostaria muito de enfrentar um cenário em que ao invés de enfrentar o vento contra o rosto pudesse pegar um vento de cauda para a gente andar mais rápido. Eu peguei um período muito difícil e tenho certeza em afirmar que é o pior período para qualquer ente público nos últimos 20 anos.
A queda de arrecadação é brutal, para todos os estados, mas principalmente do Norte e Nordeste, porque os estados do Norte e Nordeste são muito mais dependentes do FPE (Fundo de Participação dos Estados) do que os do Sul.
O FPE caiu muito, que é a transferência do governo federal para os estados. Com essa queda, nós estamos passando momentos difíceis. Se tivesse que fazer um desejo para a gestão, o desejo é de que o vento pare de soprar contra e sopre a favor para que a gente possa andar mais rápido com as nossas ações do que nós temos conseguido.
Tribuna – Mesmo com a crise, a Bahia tem conseguido avançar. Até quando vai conseguir oxigênio para pagar as contas e o salário dos servidores do estado?
Rui Costa – Eu espero que por muito tempo. Nós temos conseguido atravessar a crise porque antes mesmo de assumir eu adotei e fiz mudanças duras, difíceis, a começar pelo corte de 2 mil cargos comissionados já em dezembro de 2014, quando aprovamos a lei.
Fechamos empresas, fechamos a Bahiatursa, IBDA, a Sucap, que era uma autarquia. Nós reestruturamos e mudamos muita coisa. Eu comecei o governo me reunindo mensalmente com os secretários de administração e da Fazenda, mudei para quinzenalmente, e hoje me reúno semanalmente com eles, a depender do mês até duas vezes por semana.
Num momento desses, você tem que fazer ajustes finos a todo tempo para conseguir encaixar. Você inicia o mês com uma projeção e termina com um menor realizado, isso no mês, não estou falando no ano. Você tem que ajustar toda a semana o que você vai fazer, o que vai cancelar, vai mudar, para as coisas se encaixarem no orçamento. É uma dedicação grande, dai leva às vezes a reclamação de que eu não dedico muito tempo à política como muitos gostariam, mas é a necessidade de estar ajustando a todo tempo a máquina pelas dificuldades que tem.
Não tem jeito, aqui funciona o ditado de que o boi só engorda com o olho do dono. Aqui também só se consegue fazer os ajustes se o governador estiver colado. Notícia boa e ação boa todo mundo gosta de fazer e dar, mas quando é para cortar, tirar, reduzir, ninguém gosta. O governador também não gosta, mas é necessário.
No limite sou eu que empurro para as coisas acontecer. Quando você reúne com o secretário e diz que vai fazer tal ajuste lá, se o ajuste é para folgar, todo mundo quer fazer. Mas se é para apertar… se você não checar na semana que vem, não vai ser feito. É para cortar, aí ele fala e agora? Eu digo: se vire, você é meu secretário para isso. Você não quer que eu vá lá fazer no teu lugar?
Eu reúno em uma semana e na semana seguinte vou checar se fez. Isso foi o que fez com que a gente chegasse até aqui, eu pretendo continuar fazendo, mas é evidente que isso tem um limite.
Tribuna – O senhor tem muitos planos e prioridades. O que a gente pode colocar como meta que está na cabeça e ainda não saiu do papel?
Rui Costa – Não tem nada que estava na cabeça que não tenha saído no papel. Eu não criei nada que não tivesse sido planejado, fruto do programa de governo participativo. Foi a primeira vez na Bahia, diria até no Brasil, não conheço outro caso, que alguém que foi candidato a governador e investiu seis meses rodando o estado, fazendo plenária.
Eu reuni 50 mil pessoas no estado, presencial, com lista de presença. Pessoas que fora desse momento se reuniram e fizeram debates, mas que estiveram com a presença o candidato durante seis em diversas regiões do estado?
O nosso programa de governo, que está registrado, é fruto desse amplo debate. Estamos materializando isso. Tem coisas que eu não comecei porque não tive dinheiro. Por exemplo, eu aprovei o Programa do Primeiro Emprego, que agora vou lançar o emprego dos jovens que concluem o segundo grau no curso técnico. Aprovamos a bolsa de estudo para dar aos jovens de famílias carentes que estão nas faculdades estaduais.
Tribuna – O senhor vai entrar para a história como o governador que colocou o metrô para andar nos trilhos. Gostaria de ser reconhecido, ao menos na primeira gestão, como uma das suas principais marcas?
Rui Costa – Assim, eu diria que da mobilidade urbana com certeza, mas quero ser conhecido ao final do mandato como o governador que deu um passo importante para melhoria da educação no nosso estado. Esses dois projetos que eu falei, o primeiro emprego e o da bolsa, são incentivos claros, direto às camadas sociais mais simples, que vale apena o esforço, vale a pena a dedicação, que o estado está disposto a apoiar esses jovens. A contra capa da violência é o estímulo à educação, a arte, a cultura.
O jovem se dedicar a ter boas notas, aprender e saber que isso vai valer a pena. Eu quero implementar uma conjunto de mudanças, já estou fazendo, mesmo com a crise na educação, que valorize.
Eu já visitei 195 escolas ao longo desses meses, não é pouca coisa. O objetivo, mas que uma obra, o governador não realiza só obras, tem algo de mensagem, de símbolo, que o governador deve passar. Isso é tão importante quanto as obras. A minha intenção de visitar as escolas é a de que pais, mães professores servidores, alunos, vejam a importância que o governador da à educação.
As vezes eu passo mais tempo dentro da escola do que no evento que eu fui fazer. As vezes vou inaugurar uma obra, uma água, uma luz, uma estrada, eu fico mais tempo na escola do que no evento de inauguração, tudo isso conversando com as pessoas, deixando a mensagem de que o processo de transformação educacional de uma população, uma nação, não é feita apenas pelo seu governante, é feita pelo seu povo.
Se o povo entende que a educação é fundamental, se a família entende isso, a família vai se mobilizar, vai sentar com uma criança para ler um livro, incentivar um jovem a leitura, buscar alguém para dar um reforço escolar. Tem que haver uma mobilização social a favor da educação. Isso é tão importante, ou mais importante, do que uma escola reformada.
Por isso eu digo que quero ser reconhecido como o governador que deu o pontapé para uma grande virada pela prioridade na educação, assim como vamos deixar uma marca grande no que eu chamo a regionalização da saúde.
Tribuna – A Bahia tem perdido o protagonismo na área do turismo?
Rui Costa – Não. A redução de voos na Bahia não foi exceção, se fosse ficaria até mais fácil de resolver. A crise econômica reduziu voos no país inteiro, até no interior mais rico do país, que é São Paulo houve redução de voos.
O dólar valia R$ 2 há dois anos, as aeronaves, que representa boa parte do custo das companhias aéreas, geralmente são alugadas ou compradas. Só que o contrato foi feito com o dólar a R$ 2, quando esse dólar passa a valer R$ 4, se aumentou o custo de uma hora para a outra. O custo subiu drasticamente e muitos voos que tinham viabilidade economicamente ao preço do dólar a R$ 2, a o preço de elevado já não é rentável.
Tivemos, em todos os estados, a reduções de voos. Fechamos um acordo no qual tivemos aumento lá em Porto Seguro. Temos um problema talvez com o destino Salvador, mas em outros lugares temos aumentado.
Em Salvador é um problema complexo, estou marcando com o secretário de Turismo novo para rever e espero que ele consiga abrir um diálogo forte com o segmento, porque tem muitas coisas para rever no serviço de Salvador.
Tribuna – E onde está o gargalo governador?
Rui Costa – Precisamos melhorar a qualidade de alguns serviços. O Centro de Convenções nós estamos estruturando para fazer um novo no qual eu possa disputar os maiores eventos do mundo. Eu recebi o Trade aqui, tenho opinião diferente da deles. Eles acusam muito a dificuldade recente que tem com o Centro de Convenções.
Eu tenho a pauta do Centro dos últimos cinco, seis anos. A pauta era formaturas e eventos locais, não era trazer gente de fora. Então, a pauta do Centro de Convenções 80% eram eventos locais. Não é isso que é responsável pela quebra do destino Salvador. Acho que isso é muito mais complexo, envolvem serviços, a cidade cresceu, as pessoas que vinham para Salvador queriam a cidade bucólica. Tanto é que muita gente desembarca no aeroporto de Salvador e vai para as cidades vizinhas, vai para o Litoral Norte.
Quem vem para a praia quer ir para uma região mais tranquila, que guarda um paisagismo mais natural. Salvador ficou urbanizada e concorrendo com outros destinos urbanizados. Precisamos nos reinventar para alavancar o turismo. Eu disse na posse do novo secretário que junto com o segmento temos que nos fortalecer no que somos diferentes dos outros, e não repetir o que os outros tem.
Tribuna da Bahia – Governador, Salvador mereceu uma atenção especial do senhor no início do governo. Foi para tentar tomar a prefeitura de ACM Neto?
Rui Costa – De jeito nenhum. Aqui moram três milhões de baianos. Eu tenho que governar para os baianos, eu governo para as pessoas, não para o CNPJ. Eu fui eleito para os baianos e um lugar onde moram três milhões de pessoas é ou não é para ser cuidado? Um lugar que tem o maior desemprego do país, a infraestrutura urbana mais fraca, o morro caindo e matando as pessoas.
Se eu tivesse pensando no eleitoral, estaria fazendo o oposto. Foi o que muita gente no passado fez. Massacrou o prefeito quando era de oposição. As pesquisas indicam que tem um percentual muito alto da população que acha que boa parte das nossas obras quem fez foi o município. A obra no município favorece o gestor, não prejudica.
Se eu quisesse disputar com o gestor, ou prejudicar ele, não era fazendo muitas obras, era fazendo obras em outras partes do estado, que não aqui. Mas eu não fui eleito para maltratar o povo da capital, fui eleito para cuidar dos baianos e das baianas, independente de onde moram.
Vou cuidar de todos, dos que moram aqui e em qualquer lugar, e por ser um aglomerado que tem gravíssimos problemas sociais, eu tenho que cuidar desse lugar com muito carinho. Até porque, é algo que eu gosto de reafirmar, que Salvador não é e não será uma cidade agrícola, uma cidade industrial. Salvador é, e sempre será, uma cidade de serviços, incluindo os serviços de turismo. Não existe uma cidade de serviços sem mobilidade, sem novos vetores de desenvolvimento para comércio lazer, saúde.
O que estamos fazendo com os novos corredores, novas avenidas, é abrir novos vetores de desenvolvimento e gerar empregos e oportunidades para a nossa gente. O investimento em Salvador é um investimento em três milhões de baianos.
Eu não penso na prefeitura ao fazer obras, pois estaria aceitando a recomendação de muitos que ficam dizendo para eu não colocar obra em Salvador porque quem capitaliza essas obras é o município. Mas eu não penso nessa capitalização, penso nas pessoas e, por tanto, diria que fazemos obras em todo o estado hoje.
Tribuna – Sua estratégia política de pulverização das candidaturas em Salvador está correta? O senhor acha que Alice chega ao segundo turno?
Rui Costa – A estratégia não é de pulverização, mas a de que, com as candidaturas colocadas, não impedir, ou não pedir, que elas não fossem lançadas. O governador não impediu e nem pediu para ninguém retirar candidatura. Eu não impedi ninguém de lançar candidatura. E acredito que pelos perfis das pessoas colocadas, se houvesse uma semelhança, até se discutiria uma retirada, porque elas iriam disputar o mesmo eleitorado, mas não houve uma sobreposição de perfis.
Temos três candidaturas com perfis bem distintos, acho que são complementares na linguagem, público alvo, forma e conteúdo das propostas. Vão apresentar coisas diferentes, falar coisas diferentes. Óbvio que vão falar para a cidade toda, mas cada uma temum público prioritário na fala e por isso que acho que elas podem se complementar, fazendo com que a gente tenha um segundo turno.
E o segundo turno não dependerá apenas do desempenho de uma candidatura, dependeremos das três candidaturas pontuarem nas pesquisas para levar a eleição para o segundo turno. Se uma só pontuar, fica mais difícil o segundo turno.
Tribuna – Como tem sido até aqui a relação do senhor com o presidente interino Michel Temer. Pode mensurar algumas mudanças de relacionamento?
Rui Costa – Funcional. Eu conversei até agora com os ministros dele, mas com ele ainda não. Encontrei com o Geddel (Vieira Lima), ele me ligou uma vez, falei com ele por telefone, e a segunda vez o encontrei no avião. Foram as duas vezes que falei com ele nesse período pós o presidente interino assumir.
Tribuna – Como o senhor vê o loteamento de cargos que marca esse início do governo Temer? Uma repetição do erro que acontecia nos tempos do PT?
Rui Costa – Acho que temos um problema, e não vou caracterizar erro desse governo ou do PT, mas vivemos um tempo em que é urgente e a sociedade brasileira precisa exigir uma reforma política profunda em nosso país, sob pena de construirmos um país melhor. Definitivamente, não é possível construir um país com 40 e tantos partidos e 30 partidos com representação no Congresso. Não existe isso no mundo.
Para saber se é possível ou não vamos olhar algum país que deu certo no mundo com esse nível de pulverização. Não existe em lugar nenhum, até porque não existem 40 ideologias, 40 propostas, 40 visões de mundo. O que é um partido político? É um conjunto de ideias, alternativas para o país, que, pela afinidade, as pessoas se juntam em um partido.
Olhe os últimos partidos. Foram criados por quem? Políticos ou advogados? Os últimos partidos foram criados por escritórios de advocacia. Não foram políticos que depois de debates com teóricos, com pessoas que concebiam alternativas de mundo, resolveram escrever um documento e criar um novo partido. São criados por escritórios de advocacia e estão sendo comercializados.
O que a gente ouve de diretórios municipais, estaduais, que são comercializados para esse ou aquele… A relação com o parlamento muitas vezes ficou ruim. Virou uma relação do toma lá, da cá.
Tribuna – Na visão do senhor foi a política, a roubalheira ou a economia que derrubou a presidente Dilma?
Rui Costa – A política e economia juntas. Essa questão do combate à corrupção, se fosse por isso ela seria presidente por muitos e muitos anos no Brasil. Se tiverem cinco pessoas honestas e rigorosas, eu diria ‘cri cri’, com a questão do mal feito, entre as cinco pessoas no Brasil, uma você tinha que colocar ela.
A política no Brasil vem há anos sendo financiada desse jeito. Como foi feita a reeleição do ex-presidente Fernando Henrique. Todos estão falando agora, denunciando, abrindo o jogo, vocês vão ver as delações das principais empresas brasileiras. Vão retomar lá de trás. Sempre foi feito esse modelo, não é novidade.
Aliás, o mensalão, que foi dito que era o mensalão do PT, foi a cópia, xérox autenticada, do que foi feito em Minas. Até a pessoa que organizou foi a mesma. Foi lá aconselhar o governo federal a fazer a mesma coisa. No caso da presidenta, não foi a forma de financiar a política que a derrubou. Quem derrubou foi o problema político, em primeiro lugar, com o apoio do problema econômico. Se tivesse a crise econômica, mas ela não tivesse o grande problema de relacionamento econômico, ela não teria caído.
A crise política com o país com altas taxas de crescimento, ela também não teria caído, pois estaria com a popularidade alta. Houve uma conjugação da popularidade baixa, fruto do problema econômico, associado à crise política de relacionamento com o Congresso, e que foi galvanizado pela grande mídia nacional, como uma mensagem de que o país estaria sendo passado a limpo. Tanto não está que as denúncias continuam com membros hoje que estão no governo atual, e vão continuar.
Tribuna – O problema então está no financiamento de campanha?
Rui Costa – As campanhas no Brasil sempre foram financiadas assim. Se criou o modelo de relacionamento com o mundo empresarial que começa pelo financiamento e Deus sabe lá como termina. Como termina depende de cada um, mas começa sempre pela política. Muitos, inclusive eu, e outros do PT, e de outros partidos, há anos pedem financiamento público ou outro modelo de financiamento de campanhas políticas no Brasil, mas nunca se deu audiência, terminava todo mundo ficando cômodo, sempre foi cômodo para todo mundo ter a facilidade na modelagem que era feito o financiamento empresarial.
Tribuna – Acredita que Dilma tem condições de retornar ao poder após o julgamento no Senado?
Rui Costa – É uma questão de prognóstico, não estou na cabeça dos senadores. Quando os votos para condenar e afastar estão na faixa dos cinco, seis votos, em um total de 81, e muitos dizem que não revela os votos, é dar palpites. Eu prefiro não dar palpites.
A presidenta está trabalhando com sua equipe, inclusive o ex-ministro Jaques Wagner, está trabalhando no sentido de convencer a volta da normalidade democrática, que é ela voltar ao cargo. É uma aberração jurídica o afastamento da presidenta. Um golpe aplicado na presidenta eleita. Em um momento de baixa popularidade, se deu um golpe institucional, não é um golpe militar, mas institucional de tirá-la de forma abrupta do cargo.
Tribuna – Como o senhor analisa a Lava Jato e a ameaça constante de que ela vai pegar figuras proeminentes da Bahia?
Rui Costa – Eu acho que ela é parcial e direcionada. Não é imparcial. O símbolo da Justiça é alguém com a venda nos olhos, que vai fazer justiça independente de quem tiver, tanto faz se contra A ou contra B. Infelizmente não é assim que a Justiça e os órgãos de investigação têm se comportado. Pessoas que têm conta no exterior comprovada, fortunas, muito dinheiro, que nem sequer foram chamadas para depor, intimadas ou presas. Enquanto outros foram presos, intimados, levados para depor pela Polícia Federal.
Estão sendo aplicados alguns pesos e algumas medidas no processo de apuração e investigação. Não sou só eu que digo, o mundo inteiro está dizendo que há uma constatação de que há uma perseguição institucional política e jurídica contra algumas pessoas e legendas no Brasil, enquanto outras ficam incólumes.
Eu estou curioso como cidadão para saber de quem era aquela carga de cocaína que estava no helicóptero do senador da república (Aécio Neves PSDB-MG). Eu fico curioso. Todo dia presencio milhares de jovens sendo mortos pelo tráfico de drogas e me pergunto. O helicóptero era da família do senador. De quem era aquela carga, será que ninguém descobre? A Policia Federal, Ministério Público. Imagine se um senador dos Estados Unidos tem um helicóptero com 500 quilos de cocaína. Esse cabra tava no Senado ainda?
O governo era do PT, mas as instituições são livres. O Ministério Público, a Polícia Federal. Tanto é que prenderam gente do PT. Eu fico curioso, como cidadão,para descobrir de quem é e porque o helicóptero do senador transportou 500 quilos de cocaína. Está como se nada estivesse acontecendo, não vejo os jornais cobrando. Cadê a cocaína? De quem era? Aqui, infelizmente o Brasil ficou o país da exceção onde a lei só está sendo aplicada para alguns. Isso tem que ser dito, acho que todos queremos um pais que tenha justiça, e a Justiça tem que aplicar a lei para todos, independente do cargo que ocupe.
Alguns estão sendo execrados injustamente, tem gente presa há um ano sem julgamento, enquanto outros já tiramextrato bancário no exterior, já provaram que tem conta, e sequer foram chamados para depor. É preciso que o que dê para Chico, dê para Francisco, não pode ser assim.
Tribuna – Diante desse cenário de crise que vivemos, o PT vai sofrer impactos já na próxima eleição?
Rui Costa – Toda a política vai sofrer impacto, o PT não será exceção. Agora, vai ser muito menos do que a as pessoas estão imaginando. Aos poucos as pessoas vão discernindo isso. Esse questionamento que eu faço sobre a cocaína, o povo também faz.
Eu vou no interior e o povo me pergunta: aquele helicóptero voando no sítio de Lula, um ex-presidente não pode ter um sítio não? Eu respondo que não é dele, mas não pode ter alguém que empreste um sítio? O barco dele de dois metros, de ferro fundido, de alumínio, que qualquer pessoa da zona rural tem para ir pra um riacho, um presidente não pode ter não? Eu falo que pode.
As duas horas que gastaram de helicóptero para filmar o barquinho custa umas 100 vezes o valor do barco, o tal do pedalinho, que o presidente comprou para o neto, as horas de voo devem custar umas 200 vezes o valor. Toda uma produção cinematográfica para tentar convencer o povo de que ali era um transatlântico caríssimo.
Tribuna – O que fazer para acabar com a corrupção e acabar com a sensação de impunidade dos políticos que confundiam muito o público e o privado?
Rui Costa – Em relação ao financiamento de campanha, eu sou defensor de um modelo, mas não criamos até aqui a cultura do financiamento por CPF, que é o que está em vigor agora e essa campanha vai ser uma farra do caixa 2, não tenho a menor dúvida.
Eu sou a favor, e defendi quando fui deputado em 2011, que você crie um fundo da democracia. E que as empresas contribuam para esse fundo, contribuição compulsória, de qualquer valor que a lei estipule, e que a saída desse fundo será conforme a lei determine para os partidos. Você terá um fundo, o dinheiro vai sendo depositado todo mês e a cada eleição você tira e financia as campanhas políticas no Brasil. Com isso, o dinheiro continua vindo da iniciativa privada, mas você acaba o ele entre empresário e candidato. Ele não precisa mais pedir a empresário nenhum. Tem um fundo público, com recursos privados, que vai financiar as campanhas.
Alguém pode dizer, isso acaba com o caixa 2? Provavelmente não, mas você cria a chance de quem quer fazer campanha honesta, poder fazer. Aquele que gosta e querem usar o dinheiro do caixa 2, além da campanha para patrimônio, provavelmente irão fazer o caixa 2, mas você possibilita o financiamento para quem quer fazer a coisa certa.
A gente sempre soube de gente que quer doar da forma certa, tem medo de no outro dia o nome tá no jornal. Nos estados Unidos os caras exibem os cheques das empresas, vira motivo de campanha publicitária. Arrecadação lá é sinal de que o cara está forte, então ele vai divulgando.
Tribuna – Isso bem diferente daqui…
Rui Costa – Aqui se inventou que é crime um presidente ou ex-presidente querer que empresas brasileiras façam obras no exterior. Isso, desde que o mundo é mundo, que o Brasil é colônia, que os países lutam para que suas empresas se mantenham no exterior. Isso significa dividendo, receita que entra para o país.
O alemão não quer que as empresas não venham fazer obra aqui no Brasil? O alemão oferece,o chinês, o francês, todo mundo quer. Eu lhe ofereço o financiamento, desde que quem faça a obra seja uma empresa chinesa, alemã. Isso é network, bê-a-bá de livro de economia. Desde que o mundo é mundo isso acontece e os países, presidentes, tentam encaixar suas empresas no exterior. Aqui, hoje, é apresentado como versão criminosa um ex-presidente ter lutado para que as empresas brasileiras fizessem obras no exterior.
Eu não conheço países no mundo nos quais seus presidentes não queiram que suas empresas não vendam no exterior. O pessoal inglês, alemão, oferecem. Tipo, vamos financiar o estado para renovar os equipamentos hospitalares, mas vocês vão dar prioridade para comprar os produtos do nosso país. tudo bem, é assim que funciona essa disputa das ações. Transformamos isso em crime.
A versão de investigação diz até que isso é lobby e crime. Isso é um desvio, na minha opinião, de um processo de investigação que quer condenar as pessoas onde não existe crime. Eu não vejo nisso crime nenhum, nós deveríamos incentivar que mais empresas façam obras no exterior. O Brasil estaria em uma posição melhor.
Na política eu defendo o financiamento público de campanha, quem quer fazer campanha honesta teria a chance de fazer. 2: que tenha uma reforma política no nosso país para, não reduzir de forma compulsória a quantidade de partidos, acho que a lei não deve proibir a criação de partidos. Acho que a lei não deve permitir que um partido criado hoje já possa receber dois, cinco milhões do fundo de campanha, aí é um negócio.
Não pode permitir que um partido criado hoje já possa ter tempo de televisão para negociar. Se a gente tiver clausula de barreira, que eu sou favorável, o partido só terá tempo de televisão depois de eleger x deputados, antes disso não tem direito a tempo de TV, o dinheiro de fundo partidário. Primeiro o partido tem que mostrar que o povo quer que ele exista.
Tribuna – Até quando o senhor vai conseguir carregar os fardos do PT e todo os escândalos que ele está metido?
Rui Costa – Não acho o PT um fardo, pelo contrário. Recomendo a leitura do relatório do Banco Mundial que faz o balanço dos últimos quinze anos da economia brasileira e do Brasil. Ele traça em gráficos e tabelas um balanço do Brasil dos anos 2000 até 2015 e classifica esse período, a partir de 2003, como a década de ouro da história do Brasil. E o banco mundial está longe de ser vista como instituição de esquerda ou centro esquerda, sempre foi uma instituição com valores conservadores, mas classifica essa década como a de ouro do país, e mostra que em várias áreas o Brasil deu um salto extraordinário.
Na oferta de ensino técnico foi feita em dez anos o dobro do que a história conseguiu. Do que a história do Brasil conseguiu ofertar de ensino universitário, se fez o mesmo em dez anos. Na agricultura, as famílias que vivem no campo tinham um financiamento de quatro bilhões, em dez anos pulou para 30 bilhões. Ele sai mostrando uma série de gráficos corroborando com a ideia de que o Brasil fez grandes avanços num período tão curto, e conclui com a crítica do período mais recente, de que se fez opção pelo incentivo fiscal, que favoreceu aos grandes empresários e drenou a capacidade fiscal de continuar fazendo um conjunto de políticas que permitissem o crescimento.
Paulo Roberto Sampaio e Osvaldo Lyra
Colaboraram: Fernanda Chagas e Gabriel Silva
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