Ivanildo foi enterrado na manhã desta sexta-feira, em Feira de Santana
Com a morte do policial militar Ivanildo Almeida Neves Júnior, de 31 anos, que se matou com um tiro na cabeça quitna-feira, 15, em Feira de Santana (a 108 km de Salvador), sobe para seis o número de agentes que cometeram suicídio nos primeiros oito meses deste ano no Estado.
O dado, divulgado pela Associação de Policiais e Bombeiros do Estado da Bahia (Aspra), já equivale a 66,7% dos nove suicídios de PMs no ano passado e supera a média registrada na corporação nos últimos dez anos, de cerca de dois casos anualmente.
Os números da Aspra divergem dos dados da Polícia Militar da Bahia (PM-BA). Segundo a corporação, este é o quinto suicídio em 2013, enquanto em 2012 apenas um foi contabilizado. Segundo a PM, até 2004 a média anual era de oito suicídios, e hoje a média é de três suicídios.
Causas
Sobrecarga da jornada de trabalho, rigidez da hierarquia militar, baixa remuneração, endividamento e riscos inerentes à profissão são alguns fatores apontados pela psicóloga clínica e social Uelba Alves para que um policial sinta-se motivado a se matar.
“Há muita pressão sobre os PMs, que são tratados como máquinas de combater o crime, sem ter a vida pessoal respeitada”, diz a especialista, com base nos relatos dos PMs atendidos por ela na Aspra.
Ela recorda que, durante a graduação, há cinco anos, desenvolveu pesquisa em que 80% dos 70 PMs entrevistados apresentaram alguma patologia ocupacional: alcoolismo, depressão, síndrome do pânico e estresse.
Alves alerta que familiares e superiores dos PMs devem ficar atentos a sintomas dos trabalhadores, como nervosismo, medo e introspecção. A profissional critica, ainda, a ausência de estrutura adequada para atendimento psicológico da tropa.
Segundo ela, há somente dez oficiais-psicólogos no Serviço de Valorização Profissional e Assistência Social da PM (Sevap) para cerca de 32 mil trabalhadores na Bahia.
O presidente da Aspra, vereador Marco Prisco (PSDB), considera o número de suicídios no estado uma “aberração”. “Se fosse somente um caso por ano, já seria preocupante. Não é admissível que isso ainda ocorra na Polícia Militar”, aponta.
De acordo com ele, as más condições de trabalho são responsáveis pelas baixas na PM nesse tipo de ocorrência. “Falta acompanhamento jurídico e psicológico, os alojamentos são ruins e as escalas de trabalho exploram os policiais”, afirma Prisco.
Em nota, a PM informou que os casos de suicídio não se relacionam ao trabalho. “O fator desencadeador do ato ou ideação suicidógena está relacionado ao fator crise no relacionamento ou crise existencial”, informa a nota.
O texto revela, ainda, que a PM realiza “o Programa de Autocuidado e Autoconhecimento, que busca diagnosticar preventivamente entre os PMs o nível de estresse ou a ideação suicida para encaminhá-los a tratamento”.
Segundo o vereador, o Estado vem descumprindo a lei do funcionalismo público, que prevê jornada de trabalho de 40 horas semanais. A PMBA rebate que “as condições de trabalho (escalas, ambiente e equipamentos) estão num patamar satisfatório”.
Tensão
Há 12 anos na PM, um soldado, que preferiu o anonimato, diz que optou pela profissão por conta da estabilidade financeira, uma vez que não prosseguiu com os estudos.
“À época, tive uma namorada que engravidou e tive que correr atrás do sustento da gente”, revela.
Hoje, a filha do casal tem idade igual ao tempo que o pai exerce a função de policial. “Com o passar dos anos, as contas para pagar foram aumentando, mas o salário não acompanhou”, lamenta o profissional, que faz “bico” de segurança (atividade proibida na corporação) para completar a renda.
A remuneração, diz ele, resulta também em um problema social de não poder morar em um local seguro. “Moro em bairro popular e poucos sabem que sou policial. Nunca andei fardado próximo de casa. Convivo lado a lado com o inimigo”, afirma.
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