Lá se vão mais de duzentos anos, desde que, em fins do Século 18, indígenas dos povos Imboré, Mongoió e Pataxó, que habitavam originalmente o Sertão da Ressaca, foram expulsos pelos comandados do português João Gonçalves da Costa, após uma série de embates sangrentos na região da Serra do Periperi.
Vários desses conflitos, entre os povos originários da região e os emissários da Coroa Portuguesa, ocorreram nos arredores do amplo pedaço de terra que, por suas proporções, era conhecido como “Rua Grande”.
Décadas depois da eliminação daqueles que, como afirmam historiadores locais, foram de fato os primeiros habitantes do que viria a ser o município – e, à medida que o antigo Arraial da Conquista passava a ser a Imperial Vila da Vitória e, em seguida, era elevado à categoria de cidade (inicialmente como Conquista, e, finalmente, já na década de 1940, chegando ao nome atual, Vitória da Conquista), a antiga “Rua grande” seria fragmentada e daria origem às atuais praças Tancredo Neves e Barão do Rio Branco, além das ruas Zeferino Correia e Maximiliano Fernandes.
O professor, advogado e pesquisador Ruy Medeiros cita um documento datado de 1870, no qual o então governador da capitania da Bahia, Manuel da Cunha Menezes, refere-se à localidade como um “rancho com mais de 60 pessoas” que viviam rodeadas “por fazendas de gado” – o que já emite um sinal da presença da pecuária, tida como o primeiro vetor econômico a predominar no lugar.
Como explica o também professor e escritor Durval Menezes, o estabelecimento dessa atividade pecuarista atendia aos interesses econômicos da metrópole portuguesa, a quem Gonçalves da Costa servia. Em seguida, o crescimento da pecuária atenderia também aos interesses dos grandes proprietários de terras que passariam a dominar o poder político e econômico na região, sob a alcunha de “coronéis”.
“Aqui chegando, ele [Gonçalves da Costa] teve que cumprir as ordens do rei de Portugal, para que se pudesse ocupar essas terras. Ou, pelo menos, abrir estradas e trilhas para que se ligasse à costa marítima, ao Sertão da Bahia e à capital, Salvador”, relata Durval, ressaltando que a fundação do povoado, a partir da formação das primeiras fazendas, ocorreu depois que os sertanistas conseguiram eliminar as populações indígenas que já viviam na Serra do Periperi.
Diversificando a economia
Com o tempo, a tendência pecuarista se diversificaria, passando pelo desenvolvimento do comércio, chegando ao auge do ciclo do café, entre as décadas de 1970 e 1980, e à atual predominância do setor de serviços. No entanto, independentemente de qual fosse a atividade econômica predominante, há uma característica que, segundo a análise de Durval, contribui de forma permanente para o desenvolvimento do município: a sua localização geográfica.
Vitória da Conquista se consolidou como um ponto de passagem para quem saía de outros estados do Nordeste, como Pernambuco, Alagoas e Sergipe, para viajar em direção a Salvador, ao Sul da Bahia e a estados mais ricos do Sudeste do país, principalmente Rio de Janeiro e São Paulo. Para isso, não há como ignorar a importância histórica da BR-116 – a famosa Rio-Bahia, cujo trecho que passa pelo território baiano começou a ser construído na década de 1940, mas só foi inaugurado oficialmente na de 1960, com a presença do então presidente João Goulart.
“É uma posição geográfica de capital”, compara Durval, que também chama a atenção para o fato de que muitas dessas pessoas, que vinham em trânsito pela BR-116, acabavam por se fixar em Vitória da Conquista – muitas vezes, por falta de dinheiro para prosseguir na viagem até o destino original. Segundo ele, os “forasteiros” colaboraram para a diversificação do comércio em torno da rodovia, dando origem ao adensamento comercial e populacional na zona oeste da cidade.
Assim, se antes Vitória da Conquista ficava predominantemente à margem leste da BR-116, a cidade cresceu em direção ao oeste, ocupando gradualmente a outra margem da rodovia e passando a tê-la bem no meio de sua área urbana, como é hoje.
“Vitória da Conquista é uma cidade aberta a todo mundo que vem de qualquer parte do Brasil”, defende Durval. “E quem vive, mora e trabalha em Conquista, é tão conquistense quanto eu, que nasci aqui. Ainda bem que essas pessoas doaram, de corpo e alma, as suas vidas, para que a cidade fosse o que é”, afirma o professor.
E, para explicar o que seria o município, hoje, no momento em que chega aos 183 anos de emancipação política, Durval o descreve como “uma das mais importantes cidades de porte médio do Brasil”, sendo o terceiro entre os 417 da Bahia. E menciona ainda um levantamento divulgado em 2021, que apontou Vitória da Conquista como a segunda melhor cidade do Nordeste para se viver, atrás apenas de Petrolina (PE).
Trata-se do Índice dos Desafios da Gestão Municipal (IDGM), realizado pela consultoria Macroplan. O estudo ofereceu um diagnóstico dos resultados alcançados pelas gestões municipais, em 2019, avaliando 15 indicadores dentro de quatro eixos estratégicos: educação, saúde, segurança e saneamento e sustentabilidade. O ranking pode ser conferido aqui.
“Isso não veio da noite para o dia. Teve mais de cem anos de atividade, luta e trabalho”, registra o estudioso. “Conquista não foi uma cidade que surgiu projetada por um escritório de engenharia. Surgiu de uma forma rústica, improvisada. E cresceu em todos os aspectos, na pecuária, na agricultura. Veio o café, que deu um impulso muito grande, o comércio, que é o forte de Conquista, sempre foi o que segura a cidade. Hoje, é também um polo industrial, e, mais ainda, um polo educacional”, ensina Durval.
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