Inspirado por revoltas islâmicas, movimento liderado por árabe educado nos EUA troca violência por protestos e leva esperança de paz ao Oriente Médio
Gabriela Loureiro
Jovens palestinos protestam contra a ocupação israelense na cidade de Hebron, na Cisjordânia (Hazem Bader / AFP)
O jovem Hadem*, de 23 anos e natural da Faixa de Gaza, formou-se em Relações Internacionais e Física na Universidade de Stanford, nos Estados Unidos e, atualmente, organiza protestos pelo Facebook a favor da causa palestina. Representante de uma juventude árabe idealista que saiu dos territórios ocupados para estudar no Ocidente, ele lidera pela internet o embrionário Movimento 15 de Março, que trocou os homens-bomba – típicos da militância árabe radical – por protestos pacíficos nos moldes daqueles que deram vida à Primavera Árabe.
Apontado como a nova face dos palestinos, o grupo traz esperança às negociações sobre o conflito árabe-israelense, dois meses antes de uma reunião das Nações Unidas que discutirá a criação de um estado para o seu povo nas fronteiras pré-1967. “Os principais objetivos do 15 de Março são: liberdade, justiça e dignidade. Ou seja, todos os palestinos têm o direito de serem tratados de forma ética e moral”, disse Hadem ao site de VEJA.
Os jovens do 15 de Março não se identificam com nenhum dos dois partidos políticos palestinos mais proeminentes, o extremista Hamas e o Fatah, liderado pelo presidente da Autoridade Nacional Palestina (ANP), Mahmoud Abbas. Mas, querem lutar pelos direitos de seu povo. “Esse grupo manifesta algo realmente importante: há muitos jovens que não pertencem aos maiores partidos políticos, mas gostariam de ser a voz dos palestinos”, afirmou ao site de VEJA Yoram Meital, especialista em Oriente Médio e professor da Universidade israelense de Ben-Gurion, em Negev.
“Muitos dos partidos que estão aí começaram como movimentos idealistas, mas se transformaram em grupos políticos com interesses próprios. É por isso que a minha geração perdeu o respeito por eles”, explica Hadem. Além de condenar a bipolarização da política palestina, o 15 de Março nasceu da inspiração de revoluções na Tunísia e no Egito e de outros movimentos pacifistas históricos. “Nós planejamos usar as mesmas táticas de Gandhi na Índia e de Martin Luther King nos Estados Unidos, que é a ação direcionada e não violenta, e nós também estudamos o movimento anti-apartheid na África do Sul”, conta o jovem palestino.
Pontos fracos – Contudo, o idealismo somado à falta de uma plataforma política e de afiliação com um partido é, para Meital, a principal fraqueza do 15 de Março. “É muito difícil levar pessoas às ruas se você não tem ao menos um objetivo político fixo, isso torna o grupo fraco e vulnerável”. De fato, os protestos do movimento são pequenos se comparados aos da Primavera Árabe, que reuniam e ainda reúnem em alguns países dezenas de milhares de pessoas, enquanto o 15 de Março atrai, no máximo, algumas centenas.
“No Egito, o alvo era o presidente, havia um objetivo comum entre pessoas de diferentes opiniões políticas, que era derrubar o regime de Hosni Mubarak. Mas o 15 de Março não tem um objetivo comum definido”, diz Meital. Por outro lado, Hadem afirma que o problemático contexto nos territórios palestino explica a ausência de uma participação popular massiva no movimento. “A diferença entre o Egito e a Faixa de Gaza é que no Cairo há uma população de cerca de 20 milhões de pessoas e a cidade é inteiramente conectada. Na Faixa de Gaza, a população tem 2,5 milhões de pessoas, distribuídas em diferentes localidades e, devido à vigilância israelense, elas não podem se deslocar”, pontua.
Terrorismo – Outro eventual problema do 15 de Março, segundo Meital, é a perspectiva de uma associação com terroristas no caso de os protestos alcançarem uma dimensão semelhante à da Primavera Árabe. Apesar de o movimento condenar o terrorismo e a violência, se os protestos crescerem e tomarem as ruas dos territórios palestinos, Israel seria pressionado a tomar uma atitude. “Tente imaginar que os terroristas morreriam para proteger os manifestantes palestinos, então você terá do outro lado soldados israelenses, o que pode levar a um novo ciclo de violência”, afirma Meital.
Futuro – Apesar das limitações do movimento, o especialista israelense acredita que o levante da sociedade civil é a melhor estratégia que os palestinos têm para defender a sua causa. Segundo ele, o 15 de Março ganhará importância no futuro, principalmente depois de setembro, quando a Autoridade Palestina pretende solicitar à ONU o reconhecimento de seu estado.
O professor de história da Universidade da Califórnia (UCLA) e especialista em conflito árabe-israelense, David Meyers, também acredita que o movimento trará mudanças positivas à região. “A longo prazo e por meio de atos não violentos, essas manifestações podem ter cada vez mais voz e evidenciar as consequências negativas da ocupação israelense”, defende. Para ele, os protestos pacíficos são “um caminho para o desenvolvimento” da situação no Oriente Médio.
*O nome Hadem é fictício, a pedido do entrevistado, por questões de segurança
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